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Hacksaw Ridge traz-nos a inacreditável história de Desmond Doss que serviu na batalha de Okinawa no Japão durante a Segunda Guerra Mundial, com a particularidade que Desmond era objector de consciência e como tal não disparou uma única arma durante o conflito, tornando-se o primeiro americano da História a receber uma Medalha de Honra sem disparar um único tiro.
Contado assim já é extraordinário, mas vendo o filme é inacreditável! Aliás, conforme tenho dito a quem me ouve, se isto só fosse um filme seria inverosímel tal a improbabilidade de tudo o que aconteceu. E é, justamente, o facto de ter sido realidade que torna esta história credível. Aliás, Desmond Doss recusou inúmeras adaptacões do seu percurso para cinema, pois acreditava que a obra teria de ser o mais fiel possível aos acontecimentos. De acordo com Desmond Doss Jr, filho do herói: The reason he declined is that none of them adhered to his one requirement: that it be accurate. And I find it remarkable, the level of accuracy in adhering to the principal of the story in this movie. O filme tem algumas mudanças relativamente à realidade, nomeadamente no que toca ao histórico de Doss com o pai, às circunstâncias em que o casamento aconteceu e às batalhas em que Doss serviu antes de Okinawa.
De acordo com os factos, no ano de 1942, Desmond Doss alistou-se para a Segunda Guerrra, apesar de poder gozar de isenção devido ao seu posto de trabalho. Doss recusou-se a matar alguém ou a pegar numa arma por causa das suas crenças como adventista do sétimo dia – herdadas por parte da mãe, que também o criou como vegetariano – e, como tal tornou-se soldado de assistência médica. Doss recebeu a Medalha de Estrela de Bronze pelo seu serviço em Guam nas Filipinas por ajudar soldados debaixo de fogo e durante a batalha de Okinawa, salvou 75 feridos, vindo a ser galardoado com a Medalha de Honra. Doss foi ferido quatro vezes até ser evacuado em 1945. Curiosamente, no ano seguinte, o herói contrairia tuberculose, que lhe custaria um pulmão e cinco costelas e em 1976 devido aos antibióticos ficaria totalmente surdo, recuperando apenas em 1988 graças a um implante. Apesar de todas as dificuldades Doss e Dorothy criariam um filho: Desmond Doss Jr.
O filme é dirigido por Mel Gibson, que é um dos realizadores que mais admiro (poderão ler em breve no Arte-Factos o meu testemunho a Braveheart). Hacksaw Ridge valeu-lhe mais uma Nomeação ao Óscar de Melhor Realizador. O filme está extremamente bem feito e é apaixonante, sobretudo pela história inspiradora. No entanto, tem algumas incongruências ou limitações, sobretudo a história do irmão de Doss, que é abordada inicialmente e depois fica em suspenso, e a cena em que Doss salva o Sargento Howell.
Quanto ao leque de actores escolhidos, é de talento: consagrado ou prometedor. Temos veteranos como Vince Vaughn, Hugo Weaving (numa incarnação supreendente e tocante) ou Rachel Griffiths (que já tinha saudades de ver e vou associar para sempre à melhor série alguma vez realizada: Six Feet Under). Temos Sam Worthinghton que não é veterano nem novato e que cumpre bem o seu papel. E temos novatos como Teresa Palmer, Luke Bracey (desconfio que vamos ouvir falar muito de ambos no futuro e que nos brindarão com performances dignas de nota), Milo Gibson (o filho do realizador) e, claro, Andrew Garfield: o grande protagonista e que foi merecidamente nomeado para Óscar de Melhor Actor. Garfield tem uma prestação credível e tocante, consegue transmitir todos os sentimentos contraditórios que atravessariam Doss e que atravessam ainda muitos de nós. A cena do resgate dos seus colegas é uma sequência digna de nota, tal como o é a cena do abuso de que é alvo por parte desses mesmos. Doss/Garfield continua fiel à sua causa ao longo de todos aqueles acontecimentos com a consciência de que nada exterior a si pode abalar os seus valores. Esta é, aliás, uma das grandes lições que se retira desta história extraordinária: a força do poder da mente e o papel decisivo que representa na nossa atitude. Como Confúcio teria dito: “Aquele que diz que pode e aquele que diz que não pode têm ambos razão.”.
Hacksaw Ridge é um filme que – sem dúvida – vale a pena. Tem momentos divertidos e momentos comovedores na dose certa, como é habitual nestes épicos dos grandes estúdios. Eu esperava um pouco mais dum realizador como Mel Gibson e é verdade que grande parte do mérito do filme é o facto da história ser tão grandiosa e inspiradora. Levá-la ao grande ecrã é também de louvar e, mesmo que o filme não seja perfeito (embora tivesse potencial para tal e está, inclusivamente, na corrida ao Óscar de Melhor Filme do Ano) é maior do que a própria vida, no sentido que imortaliza actos heróicos duma pessoa que de facto existiu e os realizou. Acho que esse é um dos principais papéis do cinema, trazer-nos histórias de bravura que nos inspirem a sonhar, que nos inspirem a ser melhores, e quando a fonte de onde o filme nasce vem da realidade a força é ainda maior. Alguns dos temas que Hacksaw Ridge levanta são perfeitamente actuais e desconfio que ainda ouviremos falar muito de tais assuntos no futuro. Filmes como este fazem falta para nos relembrar do horror da guerra and – in the end – do nonsense de todo este tipo de conflitos. Somos seres humanos, e as guerras são travadas por interesses económicos (apesar de outras causas ficarem com a culpa no cartório) e por pessoas que realmente não teriam muito mais opções submetendo-se a joguetes desta parada (não é à toa que no pelotão de Doss, de acordo com o filme, apenas um dos seus companheiros fosse capaz de ler). Infelizmente, essa situação ainda se verifica e nós, membros das sociedades mundiais, vendo-nos pisados e sem maneira de pôr comida na mesa, embarcamos como marionetas dos que lucram com estes jogos estratégicos. Também se costuma dizer que o amanhecer não tarda depois da madrugada mais negra; esperemos realmente que seja o caso e que seres com uma mente avassaladora e uma coragem inabalável como Desmond Doss inspirem um pouco de bravura por todos nós.