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Desenganem-se os manientos e os arrogantes, ir a museus olhar para quadros é a mesmíssima coisa que ficar em casa a olhar para a tinta das paredes secar, com a agravante da despesa de entrada e de não poder entrar em museus com as calças do pijama e as socas com desenhos de gatos e coelhos. Quando era pequeno também fazia rabiscos em pedaços de guardanapos e toalhas de mesa rasgadas, que a minha santa mãe guardava e pendurava na porta do frigorífico, como se fossem alguma coisa de jeito, para me fazer sentir orgulhoso e comer os vegetais ao jantar, mas anos mais tarde sei ver que esses rabiscos foram parar ao caixote do lixo por alguma razão. Não os impingi aos meus amigos nem lhes cobrei entrada para os ver e certamente não acreditaria que alguém fosse oferecer uma mão cheia de moedas pretas por eles, ou certamente os teria emoldurado e polido para ao menos terem de pagar o dobro do preço da moldura, que eu cá sou um empreendedor.
Não me chocou portanto que os tipos do governo ou dos bancos, que afinal são os mesmos, pusessem à venda uns quantos quadros que encontraram no sótão enquanto andavam a fazer limpezas. Claro que são tipos mais finos e portanto não têm tempo de fazer uma venda de garagem como a malta aqui no bairro faz quando um familiar lhes falece e lhes deixa o armário mais antigo lá de casa, todo carcomido nos cantos, ou a mesa de apoio com uma perna mais pequena que as restantes, classicamente disfarçada com o livro do Marx ou do Miguel Sousa Tavares que todos temos em casa, consoante a preferência clubística.
Tenho cá para mim que, de qualquer das formas, nada de mais se perdeu ou perderá com isso, e sem lhe querer tirar nada, acredito que a Miró tem muito mais futuro a cantarolar do que a pintar telas. E por uma vez que seja, digo isto de forma informada, até porque ouvi o novo álbum dela, e acho que lhe deu um nome muito bonito. Faz lembrar aquela actriz do Vicky Christina Barcelona, a morena de mamas grandes que tem fogo onde devia ter juízo, não a loira de mamas grandes com um olho no burro e outro no cigano. Se bem que isto de dar nomes próprios aos álbuns de música risca logo os nomes que podemos dar aos nossos filhos, e é mais um passo para que, a ter uma cachopa, se venha a chamar Dulcineia.
Ao contrário do que acontece nos museus, já posso dançar na minha sala de estar de calças de pijama ou sem elas a ouvir o Penelope. Repleto de sintetizadores melódicos muito retro e de graves rítmicos tão intensos quanto intoxicantes, delimitando ambientes de cortar à faca (ah, as referências) onde faz ecoar a voz da própria de forma hipnótica e embalante. É esta a essência do primeiro trabalho de Sequin, inspirado pela Pequim que recuperou (da sonoridade) dos anos oitenta e de onde trouxe uma mão cheia de histórias, todas elas ricas em sabores bastante sensíveis e que se servem de todo o espectro da língua, desde o amargo ao doce, quase sempre regados de alguma acidez aveludada, palete digna de fazer um qualquer Gordon Ramsey salivar e fazer repetir. E repetiremos então, e dançaremos mais uma vez de forma grata e liberta por entre os parágrafos da viagem dessa petiz de nome tão belo.