Reportagem


Allen Halloween

Theatro Circo

22/01/2016


© Badio Magazine

Quando o Theatro Circo anunciou o concerto de Allen Halloween, a notícia foi recebida com alguma incredibilidade. Afinal, falamos da sala centenária com pinta suficiente para receber as maiores produções teatrais. A talha de ouro e o elaborado candelabro não condizem muito bem com a cena hip hop nacional, dirá a maior parte das pessoas que já passou pelo espaço – já não bastava a música psicologicamente densa do Festival Semibreve, que marca a sua presença anualmente. Porém, foi esta improbabilidade que mais me atraiu à apresentação do músico em Braga. O Theatro Circo soube arriscar e bem, oferecendo à região uma noite que foge do arquétipo mainstream que tantas vezes ocupa a agenda.

A sala principal estava cheia, muito cheia, com poucas cadeiras encarnadas disponíveis. A tribo de Allen Halloween juntou-se para celebrar “Híbrido”, álbum lançado no mais recente Verão e que veio a demonstrar-se uma das melhores edições de 2015, um registo em que o rapper se apresenta um homem mudado, amadurecido, e em que explora os seus limites e as características do género.

DJ Nel’Assassin aqueceu o público, preparando-o para o arraso que seria aquela hora muito bem passada. Halloween entrou numa chuva de aplausos e começou por nos recordar que não é novato, que anda nisto há pelo menos uma década. Em 2006 estreava-se com “Mary Bu” e assim começou a noite, para logo de seguida percorrer os grandes temas de “Híbrido”. Ouvimos o intimista “Bandido Velho” e o intimidante “Mr Bullying” (ou “Lola” como lhe chamo com carinho), e confrontou-nos com o retrato social de um país que queremos ignorar em “Marmita Boy”.

Tocou “Drunfos” e o Theatro Circo mudou quando todos nos levantámos (finalmente) das confortáveis cadeiras para dançar. Foi este o ponto de viragem da carreira de Allen Halloween, quando em 2011 o single se tornou o seu grande cartão de visita. Recordou ainda “Fly Nigga” e “Killa Me”, outros enormes malhões da sua discografia.

Não ouço hip hop, nem conheço bem o género. Mas esta noite já fica na minha memória de 2016, tal como Híbrido foi um dos meus lançamentos nacionais favoritos. Allen Halloween é a voz de intervenção como não se ouve há algumas décadas. O seu tom pesado, e derrotado por vezes, é reflexo de um país que se sente de braços atados e sem saída, um país que exige de nós mais e melhor. E foi com esse tom que se despediu de Braga, já em encore, no seu “Zé Maluco” em que diz «aqui não há nada para mim».

Allen Halloween é um homem muito interessante e a descobrir e, por isso, recomendo vivamente a todos esta entrevista em podcast.


sobre o autor

Isabel Leirós

"Oh, there is thunder in our hearts" (Ver mais artigos)

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