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“Que escolha estranha!”, pensei eu quando anunciaram Taika Waititi como o homem responsável pelo terceiro filme de Thor como protagonista. É verdade que este se tinha tornado no herói mais aborrecido de todo o universo Marvel, fruto de uma abordagem quase clássica por Kenneth Branagh e de um equívoco chamado Alan Taylor a realizar o segundo capítulo da saga do deus nórdico do trovão (pese um terceiro acto inventivo). Mas Waititi? Eis o camarada responsável por uma série de comédias secas e imprevisíveis dos antípodas, filmes como o divertidíssimo What we do in the shadows e o excelente The hunt for the wilderpeople. Já sabemos que a relação anterior da Marvel com realizadores de tendência autoral não é a melhor (como o comprova Egar Wright), portanto ou esta era uma tentativa de levar Waititi a moderar-se na sua primeira aventura forta da Nova Zelândia ou então o estúdio estava com intenção de fazer uma verdadeira e real comédia; e o material promocional indicava que esta segunda hipótese era muito mais próxima da realidade.
O filme comprova-o: Thor: Ragnarok é a primeira comédia do estúdio, uma obra onde para lá de tudo o resto – e a história é basicamente um mapa de filme, levando os personagens do lugar A para o lugar B – a ideia é diversão e até alguma subversão. O que é estranho é que a palavra Ragnarok tem conotações apocalípitcas nas línguas nórdicas e a aparição de Hela, a deusa escandinava da Morte, parece indicá-lo. O herói Thor anda algures no universo à procura de informações acerca do seu pai e quando regressa a Asgard, encontra o seu mundo em desleixo pela acção de Loki. No entanto, a apriação de Hela leva ambos a escapar e a iniciar um périplo pelo universo que é, sabemos logo, o grande objectivo do filme. Thor acaba num planeta de gladiadores, reencontra Hulk e tudo se torna ainda mais estranho. O que surpreende é o quão divertido Thor: Ragnarok é. Não se trata de uma ou de outra tirada cómica: cria de facto situações de comédia propositada, encoraja a improvisação (e note-se a diferença para a saga Star Wars, onde recentemente uma dupla de realizadores foi despedida por este memso motivo) e funciona como um coro grego de sátira subtil ao universo de super-heróis, de forma mais subtil do que Deadpool, por exemplo. Thor não é aqui um deus campeão, passa várias vezes por tolo bem intencionado e gabarolas que é algo das piadas de toda a gente. As próprias relações existentes noutros filmes são aqui abordadas num prisma diferente: a irmandade de Loki e Thor, antes de contornos épicos e profundos, soa aqui muito mais real, como dois irmãos que se chateiam e são o oposto um do outro, mas família é família. Waititi mantém a sua sensibilidade intacta no seu filme comercial, o que não é coisa de pouca monta, compreendendo o sentido de puro gozo e diversão destes filmes, enquanto entende claramente a iconografia do épico inerente ao género.
Os terceiros filmes dos heróis marvelianos têm-se caracterizado por alguma subversão da fórmula (alguém se recorda do que aconteceu ao Mandarim no terceiro Iron Man? Tipo isso), mas isso aqui é esticado e há, por uma vez rara, que um estúdio habitualmente acomodado concluiu que o dinheiro ganho noutros filmes já chegava e era altura de correr algum risco. Valeu bem a pena, porque Thor: Ragnarok é um mimo: há surpresas verdadeiramente ridículas ao longo do filme (incluindo o cameo mais fora de tudo deste ano) e Jeff Goldblum a poder ser o mais Goldblumiano possível. Lark Ruffalo e Chris Hemsworth são fogo posto (um ardente, o outro brasa leve como diria Hulk) e apesar de papéis escritos algo em cima do joelho, há verdadeiramente espaço para heróínas e vilãs brilharem e deixarem marca. No entanto, todo este esquema montado para causar diversão funciona ocasionalmente contra o filme em pontos importantes. Quando é pedido ao espectador que que desça um pouco às emoções, principalmente num mommento em particular, torna-se difícil e embora se lide com temas até bastante pesados como escravatura ou genocídio, embora pela rama, o filme parece desejar ser a festa e a meditação quando só há espaço para uma e a música sai das colunas em volume demasiado elevado para dar espaço a tudo o mais. Aqui, Taika Waititi não consegue o equilíbrio de outras obras suas anterioers e a ideia principal do filme de renovação perde-se no meio da gargalhada.
Ainda assim, a liberdade que foi dada ao realizador é surpreendente e isso ajuda mais o filme do que prejudica. O humor é rasteiro e inteligente em simultâneo, a acção bem filmada e Hemsworth, redescobrindo-se como actor de comédia, nunca esteve tão à vontade no papel como neste filme. Toda a gente, aliás, passa a ideia de uma diversão pegada e até Cate Blanchett aprecia uma das poucas oportunidades de se colocar fora de dramas e com espaço para simplesmente ser mais marota do que má. Apesar das referências habituais ao universo Marvel, sobrevive como filme é é de uma tolice saudável e imensamente divertida. Pegando na deixa surreal que atravessa as duas horas e meia de duração, é um verdadeiro enthortenimento.