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Desabafo: a nossa relação com os Beach House não se encontra num momento fácil, e isto pesa-nos no peito, acreditem. A caminho do Coliseu dos Recreios em Lisboa, na passada terça-feira, para mais um concerto da banda, não estávamos seguros das nossas expectativas para a noite que se seguiria, na verdade, nem sequer estávamos convencidos se esperávamos de facto alguma coisa. Tentemos então explicar-vos estes sentimentos confusos, e, se vos interessar, sigam as próximas linhas.
Somos fãs dos Beach House desde o começo e a primeira centelha acendeu-se aos primeiros discos. Beach House e Devotion, faziam-nos olhar para o duo de Baltimore, como na adolescência se olha de longe para aquele rapaz ou rapariga misteriosos no pátio da escola – um amor platónico cheio de anseios, anónimo por entre declarações rasuradas em cadernos e paredes.
Com a chegada de Teen Dream, em 2010, apaixonámos-nos irremediavelmente. Naquele que, muito provavelmente, será para sempre o seu melhor disco, era impossível não sucumbir à emoção de músicas como “Zebra”, “Norway”, “Walk In The Park” ou “10 Mile Stereo” (as duas últimas recordadas na noite passada). Convencidos de nunca antes ter ouvido algo assim e de termos encontrado amor para toda a vida, o namoro tornou-se rapidamente coisa séria, de tal forma que nem pensámos duas vezes quando, dois anos depois, aceitámos o pedido de casamento de Bloom – o disco que consolidava Victoria Legrand e Alex Scally como os criadores da dream pop, sons feitos da mesma matéria de que são feitos os sonhos, portais para dimensões antes inalcançáveis.
Até aqui a discografia da banda parecia-nos ser suficiente na espera que se seguiu até ao muito aguardado Depression Cherry, em 2015. E foi este, acreditamos nós, o momento em que a coisa se quebrou. Decorrida uma década, os Beach House pareciam não ter nada de novo para oferecer. O tédio instalou-se e a nossa atenção dispersou-se por outras sonoridades, mais audazes e cativantes. E Thank Your Lucky Stars, editado logo de seguida, veio apenas reforçar o mal-estar instalado. Recordamos na altura um artigo que questionava se precisaríamos mesmo de dois discos dos Beach House no mesmo ano? Óbvio que não, teria bastado apenas um, desde que fosse capaz de nos surpreender e de manter viva a chama.
Provavelmente já nos alongámos demasiado nesta metáfora, mas pareceu-nos importante explicar o porquê de que, chegados a 2018, a ideia de um concerto de Beach House não nos conseguir despertar o entusiasmo de outros tempos – a típica crise após os primeiros anos de um casamento feliz. Deveríamos no entanto, ter prestado mais atenção a 7, editado este ano, mas já lá chegamos.
“Levitation”, das faixas mais bem conseguidas de Depression Cherry, abre a noite com a promessa: “there’s a place I want to take you”. Terão ainda os Beach House algum sítio novo para nos mostrar? Deixamos as nossas desconfianças de lado e, de espírito aberto, estamos prontos para descobrir.
Decorridas as primeiras músicas, onde matámos saudades da sempre muito bonita “Walk In The Park”, pouco parece ter mudado. A penumbra habitual, silhuetas escondidas ao fundo do palco, a cortina dos longos cabelos atrás da qual Victoria Legrand se refugia dos olhares do público, o seu timbre arrastado, palavras entrecortadas que tornam impossíveis de perceber as letras que não temos na memória, batidas lentas e distantes, teclados atmosféricos, devaneios de guitarras – um sonho de crepúsculo à beira mar.
Eis então que surge a primeira guinada da noite: “Dark Spring”, a primeira faixa de 7, surpreende com o seu começo de bateria pulsante e decidida – James Barone é a nova adição desta digressão, informa-nos Victoria Legrand mais adiante, sem o qual seria difícil de recriar ao vivo este novo disco. Segue-se uma visita breve a Bloom com “Lazuli”, que sabe sempre bem, mas estamos agora mais interessados nesses novos Beach House que há pouco assomaram.
“L’Inconnue”, “Black Car”, “Drunk in LA”, “Girl of the Year” e “Lemon Glow” – o último abanão antes do encore – parecem oásis frescos dentro de um alinhamento de clássicos, com Depression Cherry ainda muito presente. Pelo meio surpreendem-nos também os efeitos de luzes que irradiam a plateia em muitas cores, afinal os Beach House são feitos de muitos outros tons que não apenas aquele vermelho cereja depressão. E embora nunca recusemos a magia que “Myth” oferece ao vivo, é a nova “Dive”, a última da noite, que nos faz cair o queixo com o seu crescendo apoteótico final. Sim leram bem, usámos a palavra “apoteótico” para ilustrar um momento num concerto de Beach House.
O produtor Pete Kember (Sonic Boom) parece ser o maestro por trás desta transformação, a quem Victoria Legrand agradece a meio da noite. Da nossa parte agradecemos-lhe também por ter acrescentado ao nosso refúgio preferido de praia, uma cave e várias assoalhadas. Com mais espaço para movimento, esta nova sonoridade, mais massiva e arriscada, dos Beach House, pode muito bem ser aquilo que precisávamos para salvar esta relação.