Consumismo em excesso, a digitalização das nossas vidas, uma distopia futura que já não parece estar longe, são coisas a alertar mas que, de alguma forma muito paradoxal, também deve dar para abraçar de alguma forma. Steven Wilson avisa-nos que “The Future Bites,” que é, na verdade, o presente, e que até nos pode deixar a dançar.

E se calhar é essa a abordagem que possa surpreender por parte de um músico associado ao rock progressivo e a encabeçar a sua vertente mais contemporânea, mas já não devia assim tanto. Os seus discos, ainda se voltavam totalmente ao lado artístico da música – ou pretensioso, aos olhos e ouvidos de muitos – mas cada vez mais se abria à acessibilidade e à pop. Com o aborrecimento perante a música orientada por guitarras já confessado e a ideia de que o rock dominante de outrora já é apenas um finado também já publicamente defendida, quem se deveria realmente surpreender que “The Future Bites” se renda à synthpop e esteja totalmente submerso em electrónica? “Self” desperta curiosidade, sim, mas é pelo quanto já promete tornar-se pegajosa e por mostrar que Wilson afinal nem é só um songwriter melancólico.

O festim também abranda, e faixas como “12 Things I Forgot,” “Man of the People” ou “Count of Unease” já seguem algo que podia ser dos Blackfield ou até mesmo da vertente mais calma dos já saudosos Porcupine Tree. O conceito não se deixa ficar para trás, com as narrativas dos videoclips, os deepfakes, toda a promoção e as letras a evitar qualquer subtileza. Isto ainda é uma obra conceptual além do mero álbum e colecção de canções. Mesmo que ele se pareça mais voltar agora para os trabalhos recentes do The Weeknd como inspiração, do que os antigos dos Genesis, ainda há toda uma aura progressiva num álbum de “art pop” capaz de nos dar um tema tão viciante como “Personal Shopper,” ser uma dedicatória à década de 80, mas piscando também o olho ao “indietrónico” mais moderno, como em “Follower.” Pediam-se mais músicas como “Personal Shopper” para ficarmos realmente agarrados a isto, quem o acha pretensioso vai revirar os olhos a tudo o que se passa aqui e se calhar vamos preferir o último dos Ulver e até do The Weeknd – já que se falou nele, mesmo jogando num campo completamente diferente. Mas Steven Wilson ainda é um músico que sabe o que faz.