O clima é soturno mas acolhedor. Envolve-nos mas não nos deixa ficar totalmente tristes. Até nos traz alegrias, porque parecíamos conformados mas desiludidos de que realmente não podemos ter coisas boas por muito tempo. Foram os Insaniae, foram os Dogma. Podiam ser coisas mais descartáveis, mas não, tinham que ter óptimos discos de metal gótico em português para nos fazer querer mais. Há uma nova encarnação e há nova esperança: os Malignea e a auto-intitulada estreia.

Acaba por ser um lógico seguidor de “Mallevs Maleficarvm” dos Dogma, mas com as suas devidas diferenças. Para que os Malignea tenham a sua própria identidade, mas de forma que também se entenda que esta é uma máquina muito bem oleada, que já faz isto há muito tempo, para que se justifique uma estreia deste calibre. A principal diferença, detectada logo à superfície, é a ausência de peso de Gonçalo Nascimento na voz gutural. O foco agora recai todo sobre Isabel Cristina, cujo talento em recitar todos estes poemas com esta voz já quase operática nos seduz de imediato. Sem surpresas, já conhecíamos a voz e embala-nos logo, sem retirar peso a este metal gótico, também habitual ADN das bandas antecessoras, que ainda baseia tudo num doom denso e enevoado.

A predominante voz feminina e o ainda mais apurado sentido melódico, a originar grandes canções, até nos engana ao fazer “Malignea” parecer um disco acessível. E nem tem medo de deixar entrar os arranjos sinfónicos, sem deixar resvalar para aquela marca de metal sinfónico internacional mais açucarada. Pesca ao gótico de origem Inglesa, – o instrumental destes exímios músicos poderá agradar a um bom fã de My Dying Bride ou Paradise Lost – e até do gótico bem praticado no Norte da Europa na década de 90 – The Gathering, Theater of Tragedy e Tristania como ténues referências – para criar algo com o seu próprio cunho. E muito português. Por todo o folclore que entra em “Morte Vermelha” e não só. E porque a melancolia de “Farol dos Malditos” só podia vir deste cantinho ibérico e porque tudo aqui soa muito nosso, pronto. Dá para orgulhar. A ver se desta já temos algo para desfrutar por bem mais tempo.