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É impossível dissociar o novo filme de Terrence Malick de Tree of Life, a obra-prima que lhe antecedeu. Isso é óbvio em termos formais, seja pela beleza da fotografia, pelo dinamismo da montagem ou por toda a estrutura narrativa, praticamente desprovida de diálogos, apostando nos monólogos interiores e num certo distanciamento etéreo e profundamente espiritual. No entanto, as semelhanças chegam também ao conteúdo, a uma dimensão religiosa lata que está profundamente presente nos dois filmes.
Se, em Tree of Life, o destaque era a perda e o ciclo da vida, em To The Wonder o mote é dado pelo amor. Amor de um casal, nas suas mais diversas vertentes, seja a paixão, a dúvida, o desencanto ou a saudade, mas também de uma forma mais vasta. Ele é o ponto de partida para uma reflexão metafísica e existencialista sobre os afectos, a solidariedade ou a fé.
Em causa, está um casal: Marina é francesa, Neil é americano. Começamos por vê-los de uma forma enternecedora e mágica, em 15 minutos iniciais muito bonitos e próximos da abertura de outro belo filme sobre o amor estreado há poucos meses: Deep Blue Sea. Tudo assenta no movimento dos corpos e da câmara, nos curtas palavras de Marina e numa visão cinematográfica profundamente performativa. Um pouco como, sem sucesso, Joe Wright tentou fazer recentemente com Anna Karenina.
Quando vão para os Estados Unidos, as coisas complicam-se, o sonho desvanece e Neil retoma o sentimento pela amiga de infância Jane. Temos ainda um padre infeliz (paradigmático o comentário sobre a “benção da alegria”), em conflito consigo próprio, colocando em causa a sua vocação cristã. Estas são as quatro personagens principais, num cast em que Olga Kurylenko enche a tela com a sua beleza e uma força interpretativa tocante, em que Javier Bardem, com o tom sofrido que já havia mostrado no magnífico Biutiful, do controverso Iñarritu, versatiliza mais um pouco o seu enorme talento, e em que Ben Affleck parece desajustado, pouco confortavel e sem a dimensão expressiva que se exige num papel destes (Rachel McAdams tem um papel claramente secundário em relação ao trio anterior).
To the Wonder pode não ter a chama da novidade e não deixar o espectador em transe, como sucedia com Tree of Life. Pode também perder-se um pouco numa certa fase, como quando apresenta alguma comiseração beata e sensacionalista que perturba um pouco o interessante e profundo questionamento religioso efectuado pelo Padre Quintana. Mas não deixa de ser um filme globalmente muito bonito e, novamente, uma reflexão muito poética sobre a vida. É possível odiar os filmes de Malick, mas é impossível ser-se indiferente ao seu trabalho e não reconhecer nele um lado autoral muito forte. E, quando uma aura de espiritualidade religiosa, seja em que dimensão for, é capaz de convencer e arrepiar um ateu, isso tem de ter um significado muito marcante.