//pagead2.googlesyndication.com/pagead/js/adsbygoogle.js
(adsbygoogle = window.adsbygoogle || []).push({});
Estranhos (ou habituais) fenómenos da distribuição cinematográfica portuguesa: dois meses depois do novo filme de François Ozon ter passado por Cannes, estreia entre nós o anterior, Dans La Maison. E, enquanto retrato delicioso do voyeurismo, é uma pena se, tendo estreado em plena silly season, passar despercebido.
Embora de forma lateral, o belíssimo e tragicómico Reality, que passou pelos cinemas portugueses no início do ano, era, através do mediatismo barato e do aproveitamento do showbiz televisivo, uma abordagem a esse desejo de entrada no universo privado alheio. Dans La Maison é profundamente diferente, no sentido que aborda ovoyeurismo pela via da invasão ilegal e interferência total na esfera privada.
O centro da acção é Claude, um desequilibrado jovem de 16 anos que, com um défice social e familiar forte, resolve infiltrar-se na casa de um colega de forma sistemática e relatar tudo o que se passa em textos entregues na disciplina de francês. O que começa por ser uma simples composição passa a algo bastante mais ambicioso e grave, envolvendo o professor Germain, o talento de escrita do aluno e a manipulação da família de acordo com os objectivos literários de ambos.
O filme é muito bem conseguido em termos da fronteira que delimita entre a realidade e a ficção, um pouco como também sucedia nesse interessante, mas discreto filme americano chamado The Words (estreado há cerca de um ano). Por outro lado, a junção de peças na trama é paciente, mas ritmada, mostrando um certo lado improvável da aparente família convencional da classe média (Claude fala do seu colega Rapha como sendo o “rapaz normal”). Finalmente, é notável a construção da relação professor-aluno, como Germain acaba por se transpor para Claude no sentido de compensar uma falhada carreira no mundo literário e como isso acaba por ter reflexos no decurso da história.
Há aspectos que poderiam ter sido melhor abordados. A falta de consciência do professor e da sua mulher numa fase inicial é algo inverosímil, há algum surrealismo narrativo excessivo e era escusado lançar algumas ideias sobre a escola, como as pedagogias baratas ou o uso de uniformes, quando depois não as chega a aprofundar. Mas nada que afaste Dans La Maison do belo caminho que desenvolve, especialmente porque o final é visualmente bem bonito e remata a perspectiva voyeurista do filme de uma forma bem interessante.
(SPOILER ALERT:
lembram-se do final de Funny Games?)