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Zev Guttman acorda, transpirado e desorientado começa a chamar Ruth, a sua mulher. É assim que o realizador Atom Egoyan apresenta a personagem principal deste filme, um ex-prisioneiro de Auschwitz que agora se vê confinado a um lar de terceira idade sem memória de que a sua companheira de mais de 60 anos faleceu há uma semana atrás. É nesse mesmo lar que somos apresentados a Max, também ele um sobrevivente do campo de concentração e que o incumbe de uma missão: matar o oficial nazi responsável pela morte das suas famílias. Munido apenas de uma carta com instruções minuciosas acerca do que tem a fazer, Zev vai lutar contra a demência que o distancia cada vez mais da realidade e levar a cabo uma vingança que, em última instância, pode já não lhe dizer nada.
É impossível dissociar a premissa deste filme à de Memento, mas as circunstâncias colocam ambas as tramas em pólos opostos do género. Enquanto que no filme de Christopher Nolan assistimos a uma atmosfera estilizada e artifícios carregados de irreverência, aqui há uma contenção que embala o espectador na desorientação da personagem principal. E “desorientação” é a palavra-chave, o que para nós parecem tarefas simples, como comprar um bilhete de autocarro ou apanhar um táxi, são aqui vincadas como obstáculos assumidamente penosos de ultrapassar. Cada vez que Zev acorda, continua a procurar a mulher e tem a carta de Max como única âncora e propósito final. A tensão está presente ao longo de toda a história, mas não da maneira mais convencional, a busca da personagem principal é construída através de tentativa e erro. Com uma lista de nomes para o possível culpado, Zev encontra uma série de pessoas que, de uma maneira ou outra, partilham o fantasma do holocausto e tem de se apoiar no pouco discernimento de que ainda dispõe para separar o trauma da missão de que foi incumbido.
Christopher Plummer oferece-nos uma interpretação irrepreensível e comovente de um homem a lutar com um tempo que já não é o dele, de quem é movido por uma noção de dever instintiva e quase passeia pela realidade em piloto automático num corpo que já não corresponde. O peso democrático do tempo contrasta com a prisão totalitarista que é o indivíduo quando somos confrontados com a personagem de Max, interpretada pelo veterano Martin Landau, um velho que apesar de confinado a uma cadeira de rodas e a uma botija de oxigénio, tem a presença de espírito calculista que falha ao amigo e que leva o espectador a suspeitar de algum tipo manipulação e intenções menos claras. Destacam-se também as interpretações de Bruno Ganz, mais conhecido do grande público por interpretar Hitler no filme A Queda e Dean Norris, o acarinhado Hank da série Breaking Bad. Infelizmente não posso falar em grande detalhe das personagens que desempenham porque o filme vive da viagem e descoberta, mas a interacção que catalisam é memorável.
Infelizmente aquele que podia ser o ponto forte do filme é onde ele mais falha. A indefinição da trama não nos deixa investir o suficiente na história de vingança ou no drama pessoal deste homem desorientado no mundo, mas temos a perfeita noção que ambas podem coexistir com outra execução e resultar num final exponencialmente mais poderoso. Centrado em interpretações, mais do que em estrutura, há uma aura de telefilme que teima em pairar em toda a hora e meia de duração. Com uma fotografia descuidada, a estética é apenas salva por uma banda sonora que serve na perfeição toda a acção, uma banda sonora que por dois momentos é interpretada de forma surpreendente pelo próprio Christopher Plummer.