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Estamos em Boston, no pico dos anos 1920 e da lei seca, mas não nos mantemos lá por muito tempo. Tudo começa quando Joe Coughlin, um simples bandido com bom fundo mas sem grandes aspirações, se mete com a namorada de um perigoso chefe da máfia irlandesa. As coisas não correm tão mal como deviam, mas Joe acaba por pagar bem caro pela infracção, acabando por recorrer a algo que até então repudiava: juntar-se a uma organização criminosa. Os italianos estendem-lhe a mão e posicionam-no em Miami, onde vai liderar as operações contrabandistas de rum. Entre fanáticos religiosos e políticas voláteis, Joe vai descobrir se é cruel o suficiente para ter o sucesso que não pediu mas é obrigado a manter.
Tenho uma especial predilecção por filmes de gangsters, em particular, por épicos que se estendem ao longo de vários anos e descrevem a ascensão ao poder e a gestão do mesmo. Vou predisposto a gostar mas também sou mais exigente, depois da banalidade que foi Gangster Squad, a esperança de ver uma história violenta, com personagens verdadeiramente interessantes, desvaneceu-se. Viver na Noite, consegue duas coisas, construir um filme de acção cativante, recheado de bravado e ter um subtexto forte o suficiente para cimentar toda a narrativa. Por um lado, temos a linearidade de um percurso cronológico com toda a felicidade e amargura que o tempo acarreta, por outro, temos um estudo bem interessante sobre liberdade e expectativas. O filme faz um esforço consciente para ligar pais a filhos, mas não serve apenas para nos fazer investir nas personagens e no destino de cada uma. Em vez disso, essa ligação prende-se com as expectativas que se depositam na próxima geração, como se pode cair na tentação de viver através dela e como a possível desilusão pode deitar por terra tudo o que se construiu até então. É também aí que entra a liberdade, como nos condicionamos, como tentamos condicionar os outros e como os outros condicionam a nossa liberdade. Uma mudança de temática muito bem-vinda e que dá maior substância a um género empolado pela glorificação da violência, que adoro, mas que, quando bem enfeitada, sabe muito melhor.
O primeiro problema que me vem à cabeça prende-se com a estética, mas não da forma mais óbvia. O filme é maravilhosamente filmado, enquadrado e todas essas coisas que saltam até à vista menos treinada, mas será que serve uma história de gangsters da melhor maneira? É uma pergunta muito complicada e à qual não tenho resposta. A tradição diz que um filme de gangsters deve ser sujo, cheio de jogos de sombras e ter a noite como palco principal, mas não será isso apenas um sintoma da habituação ditado pelos filmes canónicos do género? Se passarmos da década de 1980, não temos grandes exemplos de obras originais no género, com isto quero dizer que a estética ficou presa na nostalgia e na homenagem. Viver na Noite apresenta-se com uma imagem ultra-limpa, paisagens solarengas e uma palete de cores viva. A paisagem é a de uma Miami em inícios do século XX e as câmaras são as melhores da industria, será que não temos de lidar com isso? Quer tenhamos quer não (e quer-me parecer que sim, para evoluirmos enquanto espectadores) é um factor que distrai do aspecto mais visceral do tema.
Outro ponto menos bom prende-se com a escolha de alguns actores. Ben Affleck consegue captar a personagem principal na perfeição, mas estando-se a preparar para continuar o papel de Batman noutros filmes, parece demasiado musculado para enfrentar o boneco. Um bocado como quando Russel Crowe fez de matemático afectado logo após O Gladiador. Elle Fanning nunca chega a convencer como uma aspirante a actriz tornada bastião da moralidade, o que vemos é uma prestação amadora e desinspirada. O mesmo acontece com Sienna Miller, muito pouco esforço para espremer a quantidade de sumo que as personagens conteem. O grande destaque vai para Chris Cooper e Chris Messina, se do primeiro tal já não é surpresa, com o segundo ficamos absolutamente rendidos. O actor transfigura-se e oferece-nos um papel secundário cativante e detentor de nuances que podiam não existir com outra escolha.
Viver na Noite não se compromete ao género e oferece-nos mais do que estamos à espera. A surpresa pode ser boa, mas também pode desiludir quem está à espera de uma história de gangsters mais convencional.