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Parecia-nos pouco provável ver os Faith No More reunirem-se outra vez para tocar ao vivo, quanto mais para gravar um disco. A ausência era quase colmatada pelo desdobrar de Mike Patton, esse mestre do disfarce, por mil e um projectos paralelos – mas, no fundo, não era a mesma coisa. Felizmente, numa linda manhã, algures em 2009, depois de termos cuspido os cereais do pequeno-almoço sobre o teclado e o ecrã do computador, gritámos, “Pára tudo! Os Faith No More estão de volta!” seguido de um palavrão começado pela mesma letra que a palavra caracol.
O peso de um dos legados mais importantes dos últimos trinta anos – e é mais do que justo incluir todos os projectos de Patton nesta equação – aliado à expectativa causada pelo regresso da banda após um hiato de dez anos, poderá culminar em julgamentos precipitados por parte de um público que não se coíbe de ouvir um disco pela primeira vez com as mãos cheias de pedras. Por isso, manda a ética escutar o disco meia-dúzia de vezes, deixá-lo descansar e ouvi-lo mais uma vez antes de se tecer juízos precipitados – algo que jamais acontece, bem sei.
Chega-nos finalmente o sucessor de Album of the Year (1997), Sol Invictus. Num primeiro impacto surge-nos um disco que peca por falta de coesão. Não que seja demasiado heterogéneo – julgo que esse conceito não se aplica a esta banda -, mas nem todas as faixas apresentam a mesma consistência em termos de songwriting.
“Sol Invictus”, a faixa que dá nome ao disco, ilustra bem esse aparente fracasso em chegar a uma finalização que vá além do satisfatório. Uma faixa que exigia mais do que os parcos dois minutos e meio que lhe são concedidos e que- apesar da ausência de respostas (será?) fazer sentido dado o conteúdo lírico – acaba abruptamente quando parecia estar a chegar a algum lado. É pena, uma vez que conserva dois excelentes, e absolutamente distintos, registos vocais de Mike Patton. Se por um lado nos parece difícil desculpar uns Faith No More que outrora foram mestres na arte de chegar ao climax de uma canção, quando parece que, por preguiça, deixaram a meio uma faixa com um refrão com potencial para ser um dos mais bonitos na sua discografia, por outro, se escutarmos com atenção, podemos constatar que o que de genial há no trabalho desta banda reside precisamente no facto desta nos trocar as voltas com os melhores dos plot twists e introduzir com crueldade os ditos climaxes, fazendo-os mais breves do que seria de esperar.
A segunda faixa faz justiça àquilo que os Faith No More nos têm oferecido ao longo das últimas três décadas. “Superhero” devolve-nos as dinâmicas tão características da banda, demonstrando, ainda, algo que fica claro ao longo do disco: os refrães em Sol Invictus, apesar de simples – são os Faith No More mais directos que já ouvimos-, são eficazes e ficam no ouvido. Já nos apercebemos também do especial requinte das linhas de piano e de que a guitarra, por vezes, opta por fundir-se com a restante instrumentação, chegando a adoptar uma postura mais atmosférica, nem sempre comum em Faith No More, em vez de se exibir com a excentricidade saloia do rock (que a banda sempre soube parodiar).
Instrumentalmente podem não estar no auge da ousadia, mas, ainda assim, apresentam-se invejavelmente sólidos. Em “Rise of the Fall” vão buscar a melódica, instrumento imortalizado em “Midnight Cowboy” de Angel Dust (1992), e assinam uma faixa que deixa vir ao de cima a maturidade da banda – maturidade, essa, evidente também em “Sunny Side Up”, “Cone of Shame” e “Matador”. “Separation Anxiety”, com um baixo maquinal, seria irrepreensível, não fosse pelo facto de deixar-nos com a sensação de já a termos ouvido algures no catálogo Faith No More / Tomahawk e de certas partes da letra, sejamos honestos, não estarem ao nível a que fomos habituados.
Evitando o trocadilho fácil com nome de uma das músicas mais emblemáticas da banda, podemos concluir que a idade não amansou os Faith No More. Afinal de contas, Mike Patton apresenta-se confiante e sem receio de arranjar confusão com o primeiro fanfarrão que lhe aparecer à frente. Ora escutemos a sinistra “Motherfucker”, um dos pontos altos do disco, com Roddy Bottum a cantar num registo mais perto do rap do que de outra coisa.
Ao contrário do que aconteceu com os Swans – nenhuma banda soube voltar ao activo melhor do que eles -, os Faith No More admitiram com modéstia que nunca fez parte dos planos regressar com um disco que rompesse com o que haviam feito no passado. Deixaram claro, sem pretensiosismos, que quiseram escrever algo que fosse ao encontro do que de mais nuclear há em Faith No More – queriam apenas escrever um bom disco, não um disco extraordinário ou reinventar a roda; queriam ser os mesmos Faith No More de sempre.
Apesar de haver novos elementos na salada de géneros musicais que é Faith No More, Sol Invictus, revisita de forma mais ou menos evidente os três lançamentos anteriores da banda, bem como alguns capítulos da saga Tomahawkiana. Não é um disco medíocre, é um bom disco, mas mentiríamos a nós mesmos se disséssemos que não estávamos à espera de mais.