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Dez anos depois de se juntarem como banda, os Linda Martini lançam “Turbo Lento”. Um trabalho robusto, pleno de dedicação, e que nos mostra que o quarteto lisboeta não teve medo da pressão resultante do sucesso do álbum anterior, e que passou este teste de maturidade com uma enorme distinção.
Ao iniciarem a sua viagem com “Olhos de Mongol”, os Linda Martini mostraram ao que vinham: queriam ser uma banda punk, sem tocarem Punk Rock ou o Hardcore das suas raízes pessoais. Uma premissa teoricamente complicada de atingir, mas que na prática resultou da melhor forma. A atitude irreverente do punk, a agressividade do hardcore, os rendilhados do pós-rock e uma pitada de grunge pelo meio, fizeram nascer a enorme referência do rock nacional da actualidade.
Em processos mais curtos, directos e incisivos, ocuparam uma casa que cedo se tornou demasiado pequena para acolher todos os que queriam espreitar a genialidade que se produzira lá dentro. Esmagaram as dúvidas que surgem sempre no segundo álbum de qualquer banda (e já as vinham destruindo lentamente com os Ep’s que editaram entretanto) e confirmaram-se como gigantes nos palcos que foram sendo cada vez maiores, mas onde os quatro se sentiam cada vez mais à vontade.
E chegaram agora à maturidade, ao ponto em que saltam para uma major label (Universal), e em que se tentam equilibrar em cima do pedestal que conquistaram com o seu talento. E a resposta não podia ser mais positiva. Os Linda Martini estão bem firmes no topo, e ainda que o processo de criação possa ter sido turbulento (uma das várias interpretações que a banda já admitiu serem possíveis para o título do novo trabalho), o resultado final é o mais tranquilo possível: um excelente álbum.
As comparações com o genial predecessor “Casa Ocupada” são inevitáveis, mas talvez injustas. O tempo carimba sentimentos muito específicos em alguns temas, e as inúmeras audições já cravaram nos ouvidos os versos transformados em refrões orelhudos, mas as letras de “Febril” ou “Aparato” ainda não têm esse estatuto. Haverá em “Turbo Lento” muita matéria para se tornar mítica nos concertos que estão para vir, e talvez aí deixemos de lado as comparações, e façamos a fusão destes dois trabalhos como uma continuação, e os possamos entender quase como um corpo de trabalho uniforme.
Esta peça no puzzle que são os Linda Martini começa com “Ninguém tropeça nos dias”, o único tema instrumental do álbum, mas agora mais curto do que os habituais momentos introspectivos que a banda introduzia no passado. Dois minutos de aquecimento, para preparar o espírito para “Juárez”, uma carga intensa de som e energia a relembrar que estes trintões ainda têm bem presentes os putos de Queluz que começaram o projecto.
Numa toada menos agressiva, mas não menos intensa, surgem “Panteão” e “Pirâmica”, onde André Henriques se alonga mais do que o habitual nas letras, outrora mais concisas. É aliás no campo das palavras que se nota alguma evolução neste novo trabalho, já que as letras parecem mais maturadas do que espontâneas, mais pensadas do que vividas e mais cuidadas em todos os temas.
“Sapatos Bravos” é um dos melhores (senão mesmo o melhor) apontamento de “Turbo Lento”, e condensa nos seus 5 minutos tudo aquilo que de bom têm os Linda Martini: a avalanche de força, única da bateria de Hélio Morais, o duelo de riffs entre as duas guitarras, ora mais melancólicas, ora mais caóticas, e o baixo de Cláudia Guerreiro a dar ritmo e sentido a tudo isto. “Febril” continua com os mesmos sapatos da música anterior, até que Chico Buarque interrompe a festa, para a elogiar, mas terminando-a de forma demasiado abrupta, já que os minutos iniciais deste tema são tão bons, que ficam a saber a pouco.
“Tremor essencial”, tema escrito para o mais jovem membro do clã Linda Martini (o filho de André Henriques) antecede o primeiro single, “Ratos”, que parece um dos temas menos inspirados do disco, ou apenas aquele em que o recurso a uma estrutura mais tradicional e comercial não resulta, por não ser o campo onde a banda se apresenta com mais brilhantismo. Para resgatar a qualidade do som que tínhamos até esse momento surge “Aparato”, e de seguida “Tamborina Fera”, a música mais punk e directa do grupo: 2 minutos a rasgar, uma letra com quarto palavras, e muita gritaria a quatro vozes. “Volta” está nos antípodas do punk tradicional, e encerra o trabalho com uma calma e um flow que se tornam particularmente agradáveis depois da intensidade da jornada que vivemos até chegar aqui.
“Turbo Lento” é a consolidação de uma carreira, o ponto de aperfeiçoamento que só as melhores bandas conseguem alcançar, e a prova cabal (se dúvidas houvesse) da qualidade do quarteto lisboeta. Eles não querem ser como toda a gente, não quiseram crescer de repente, mas as rugas que ganharam serão a expressão do seu sucesso. Souberam soltar, desprender, queimar e deixar arder, sem deitar tudo a perder, e embora não pareçam preocupados com o seu lugar no panteão, deram mais um passo de gigante para o reconhecimento eterno de um dos maiores talentos que Portugal já produziu.
A Arte-Factos é uma revista online fundada em Abril de 2010 por um grupo de jovens interessados em cultura. (Ver mais artigos)