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Chega esta review em fase tardia, quando a maré de descrença e crítica violenta vaza e dá lugar aos elogios e validação que culminam com vozes a elevar os Muse à categoria de melhor banda do mundo. Um processo súbito de “besta a bestial” que tem a particularidade de versar sobre o mesmo objecto.
O fenómeno na origem desta discrepância não é novo e é francamente expectável no caso de bandas que em tempos idos eram pertenças de um pequeno nicho de ouvintes e que presentemente chegam a uma audiência mais abrangente e descaracterizada. Trata-se de uma dualidade de critérios de apreciação da música quanto ao contexto em que surge e quanto à qualidade musical, ou falta dela.
No caso dos Muse, associações a produções cinematográficas de qualidade dúbia e a sua consagração como banda de estádio, deixaram órfãos todos aqueles que se queriam demarcar da manada acrescentado à sua melomania pop um travo intelectual a classicismo.
Não é de estranhar a irritação de fãs mais antigos. De que outra forma poderão intuir nos outros a sua proto-inclinação erudita na música? Como podem exsudar a doce fragrância do intelectualismo rebelde que só um Origin of Simmetry, qual creme nivea auditivo, lhes impregnaria agora que os Muse se dedicaram a outros aromas?
Não podem. Ir a um concerto de Muse diz, face à crescente base de fãs, tanto sobre alguém como ser-se destro. E isso incomoda. Paciência.
“The 2nd Law” perdeu-se demasiado em indignação e a verdade é que não o merecia.
“Supremacy”, premeditadamente “Bond-esca”, antevê-se como um grande momento de contacto físico em concerto. Uma tensão equilibrada entre o solene e o agitado capaz de empurrar para fora da setlist um “staple” como “Supermassive Black Hole”. A voz de Bellamy a servir como um verdadeiro arauto do caos e da desordem.
“Madness”, contraproducentemente elogiada por Chris Martin, é o primeiro piscar de olhos, não muito comprometedor, com o dubstep. Uma abordagem simples, um baixo simples, o melhor solo que o Brian May nunca fez em vinte segundos, que antecipam o momento em que o falsetto de Bellamy se ouve novamente, qual trompa do apocalipse, e a canção se engrandece.
Não há, em boa verdade, nada de comedido na abordagem ao sexto álbum, o que arrasta consigo as comparações da praxe a U2 e a Queen. E que estranhos tempos estes em que as aproximações ao som dos Queen carregam uma conotação negativa. Não é como se os Queen não fossem uma das melhores bandas de sempre, nem algo que se pareça.
“Panic Station”, dê-se a mão à palmatória, é uma variação mais interessante da base de “Another One Bites The Dust” e faz do verso de “Thriller”, de Michael Jackson, refrão . É demasiado colada para não se perguntar no que estariam os Muse a pensar. Se este funk soa a novidade para Muse soa demasiado a cromo repetido para o resto do mundo. E não fugindo à temática, há que dizer que “Big Freeze”, pelo seu refrão merecia mais do que ser um out-take de um qualquer álbum de U2.
“Survival” tem a clara benesse de soar a épico marcadamente à Muse. Um exercício de grandeza, claramente exagerado e ao mesmo tempo adequado à magnitude que comportam uns Jogos Olímpicos.
Apesar da promessa de predominância de dubstep no álbum que fez torcer vários narizes, a verdade é que ainda sobra muito do que caracteriza os Muse. “Follow Me” e “Explorers” são o momento “evoluir na continuidade” de “The 2nd Law” que remetem para a semântica de Black Holes and Revelations. “Follow Me” recupera muitos dos fraseados de “Take a Bow” e “Explorers” é um aprimorar de “Invencible”.
“Animals” faz uma analepse ainda maior e recua até ao século passado e a “Sunburn”. Melodicamente mais suave não perde de vista o sentido épico de “The 2nd Law” e sofre a mesma transfiguração de grandeza que sucede em praticamente todo o álbum.
A surpresa, não anunciada, cabe a “Save Me”. Muito mais etéra que qualquer coisa que os Muse já nos tenham apresentado é um grande momento na discografia dos Muse e, de certa forma, uma peça única. Canta-se a uma Utopia por descobrir na voz de Christopher numa viagem surpreendentemente agradável.
O mesmo já será debatível quanto a “Liquid State” que soa a algo que os Baroness podiam ter feito no seu ultimo Green/Yellow mas se abstiveram por terem canções melhores. Não é má, mas era francamente dispensável.
O dubstep e as influências inegáveis de Skrillex revelam-se praticamente ao cair do pano em “The 2nd Law: Unsustainable”. Violinos e coros que fariam corar Carl Orff dão inicio à que é a principal motivadora das críticas a este álbum e para já não se entende porquê. Então o robô fala.
Estava a correr tão bem, e não há nada a apontar às modulações feitas à guitarra e até gostamos de como os Muse “deixam cair o baixo”, mas tinha mesmo aquele robô de soar tão irritante e sabujo? Não haveria uma palavra de ordem menos enervante?
Por força de querer passar uma mensagem de insustentabilidade os Muse acabam por soar mais a um episódio de “Preparados para o Fim do Mundo” do que a um despertar de consciências. Culpa de um “gimmick” quase saloio.
O álbum ainda tem tempo para o pós-apocalipse e uma última faixa como banda sonora a acompanhar. Servirá para pouco mais do que música para aquecer o público enquanto não está ninguém em palco durante um concerto. Para ouvir uma vez e saber que está lá.
“The 2nd Law” não tem, por muito que ecoem clichés acusatórios de que ” já não soam ao de antigamente” ou de ” venderam-se”, culpa da reacção que obteve. Arrisca-se a dizer que é, na verdade, um álbum extraordinário minado por pontuais momentos de mau gosto e mimese que não têm porque contagiar a apreciação geral.