Peixe

Motor
2015 | Edição Autor | Guitarra Acústica

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Motor é o último trabalho a solo do guitarrista dos Pluto e dos (grandíssimos!) Ornatos Violeta. Não sabemos bem porquê, mas é-nos difícil descolar da referência, especialmente aos Ornatos, quando falamos de novos projectos de algum dos seus antigos membros, talvez devido à enorme qualidade que estes tinham e ao marco importantíssimo que foram para a música portuguesa. Mas estes projectos são bem diferentes em todos os aspectos dos ditos Ornatos e  este Motor é bom exemplo disso .

Depois de Apneia, de 2012, é o segundo álbum de Peixe tomando como base simples guitarras acústicas. E, voilá, resultam obras dignas de um tal de Bach.

O álbum abre com “Acordar” e ouvimos no tema uma subtil referência a revolução. Uma melodia profunda, pensativa e introspectiva que faz lembrar, ainda que com mais floreados, o grande Zeca, bem como as músicas pré-revolução de 74.

Apesar de não haver letras, os títulos das peças foram extremamente bem escolhidos. Tomemos como exemplo “Até os velhos”, que remonta a histórias que os nossos avós ou pessoas mais idosas nos contam ou contavam, sempre com motivos ou sentimentos diversos inerentes, mas com um constante tom melancólico e de saudade.

“Lamento imenso” é mais um exemplo de melancolia e introspecção, com uma sonoridade que nos leva ao fado e ao “ser português”. “Locomotiva”, por sua vez, traduz numa só palavra técnicas de composição em que a peça é acelerada, bastante floreada e com secções, por vezes, repetitivas.

Em “Valsa do cowboy enamorado” a flauta junta-se à guitarra e ganhamos uma valsa com um toque fadista, daqueles fados mais alegres, com a flauta a substituir o cantor e fazer as honras melódicas.

O álbum é todo ele constituído por vários momentos, uns mais alegres e outros mais melancólicos e introspectivos, como já podemos perceber pelas referências que este que vos escreve foi fazendo. “Despassarado” e “Valsa judia” são mais dois exemplos do lado alegre, voltando a valsa a ter direito à flauta e “Despassarado” ao som de pássaros no fundo. “Dengosa” é um bom e bonito exemplo para a vertente mais introspectiva, enquanto “Suite” é mesmo uma suite bem ao jeito da música clássica, onde podemos ouvir os mais variados estados de espirito, numa única peça, bem como o caminhar até cada um dos mesmos. É também a composição mais longa de todo o álbum.

Temos ainda direito a duas improvisações que constatam melhor ainda o génio da guitarra que Peixe é. Apesar de improvisações, não deixam de soar menos fantásticas, menos bonitas e  não encontramos, de todo, nada a que possamos chamar de erro técnico na bela arte de tocar guitarra.

Não tem o rock, as distorções e toda a agressividade desse estilo que pôs o nome de Peixe, como guitarrista, nas bocas de Portugal, mas não é menos belo e não menos sentimental. Motor e Apneia provam que Peixe é um excelente e versátil guitarrista. Provam também que não são precisos muitos artifícios para fazer música bela; são mais uma ajuda à interligação entre os mais diversos estilos musicais, a tornar tanto o público como a música portuguesa mais ecléctica. Provam também que os playbacks dos programas das manhãs e tardes na televisão não são justificados e que a cultura portuguesa é muito mais variada – felizmente- que a que nos impingem aos domingos à tarde.

Motor é uma verdadeira engrenagem cheia de mecanismos demonstrados na imensidão de sentimentos, agora esperemos que a máquina não pare.


sobre o autor

Joao Neves

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