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A efeméride é o novo bragging right do Facebook. Quem publica primeiro é o maior, os restantes um rebanho de carneiros que copiaram o original e só tinham era que prestar atenção às publicações da especialidade. Seguem-se depois links e pequenos textos de como sempre se gostou daquele filme, daquele álbum ou daquele livro, de como foi importante, mesmo que até nem tenha sido, porque numa rede social, o sentimento comunitário só acontece se todos gostarmos do mesmo e celebrarmos a uma só voz coisas geniais que nem são geniais por aí além, mas até fazem anos. Coisa gira, o mundo!
Aqui no Arte-Factos, não queremos que sejam apanhados desprevenidos. Não queremos o galardão de oligarquia do hipsterismo (nada temas, ó Pitchfork!), mas é nosso desejo que saibam o que, em Cinema, faz aniversário redondo este ano. Se acaba em zer e é importante, está aqui; se faz bodas de Prata ou Platina, também o registamos. O que importa é que seja uma data relevante e importante que, algures ao longo de 2017, possam até dizer “Fui eu o primeiro”, mostrando a todos o quanto gostam de um filme que se celebra num dia particular (mesmo que até não gostem, não interessa). Por isso, esta edição do Dez Takes deixa-vos aqui uma pequena lista, por ordem cronológica, do que importa lembrar em 2017. O critério é subjectivo, mas todos são nomes sonantes e até dá para serem irónicos nas vossas preferências. Escolham com sapiência e agradeçam depois!
É o aniversário da primeira obra a vencer o Óscar de Melhor Filme, Wings, que como mais de metade do seus sucessores, teve um banho de tempo que não lhe fez nada bem; uma das obras-primas de Fritz Lang, Metropolis, celebra também o seu nascimento como uma visão de ficção científica revolucionária para o seu tempo. Outro realizador alemão, F.W. Murnau, vê Aurora a chegar ao nonagésimo aniversário, embora no seu tempo de vida tenha visto este emocionante clássico a matar-lhe a carreira em Hollywood, naquilo que se viria a tornar também um clássico: um realizador estrangeiro que chega aos EUA e é esmagado pela máquina comercial. Por fim, o primeiro filme sonoro também chega aos noventa: The Jazz singer merece ser celebrado, mas esqueçam que actores brancos pintam a cara de negro para fazer o papel de afro-americanos.
Apenas três filmes merecem o destaque: o primeiro é uma das mais celebradas obras de animação – Snow white and the seven dwarves. João César Monteiro já era nascido nesta altura, acho, mas não teve relação. A day at the races, um clássicos do Irmãos Marx, chega aos oitenta e a sua ginástica verbal continua actual. Saindo dos EUA, uma das grandes referências do cinema francês, Jean Renoir, lançou há oitenta anos La grande illusion, filme sobre prisioneiros de guerra franceses e alemães e de espantosa presciência relativamente ao conflito canibal que começaria dois anos depois e envolveria o mundo.
Um ano de choro e nostalgia: a mãe de Bambi traumatiza gerações de cinéfilos em permanência depois do estampido que se ouviu em todo o mundo; no norte de África, na cidade de “Casablanca”, Humphrey Bogart e Ingrid Bergman vivem uma das mais famosas (e citáveis) histórias de amor do século XX, porque em todos os bares, de todas as cidades, só podia mesmo acontecer ali. Outra poderosa relação de amor, a de Orson Welles com o Cinema (e si mesmo) tem um episódio trágico quando The magnificent ambersons estreia depois de ser esquartejado por um estúdio com a chamada miúfa de que a obra se esbardalhasse nas bilheteiras – o que aconteceu. A carreira de Welles nunca mais foi a mesma e visto que a cópia original do filme desapareceu, a nossa cinefilia também não.
Robert Mitchum começa a tornar-se num dos grandes actors anti—herói do cinema norte-americano no excelente film noir Out of the past, de Jacques Tourneur. Jane Greer é uma das mais incríveis femmes fatales do género. Outra mulher fatal fulminante protagoniza com Orson Welles The lady from Shanghai: Rota Hayworth, acabadinha de divorciar-se deste actor e realizador e uma das energias mais vibrantes a aparecer no grande ecrã; e terminando uma sequência de actrizes que ficam na memória, The ghost ans Mrs. Muir, também de 1947, vê a incrível Gene Tierney apaixonando-se por um fantasma interpretado por Rex Harrison. Nascia uma obra que viria a fascinar o falecido João Bénard da Costa
Este é o ano do primeiro grande filme de estúdio de Stanley Kubrick, o brilhante (adjectivo que se tornou sinónimo do realizador) Paths of Glory” Outra obra de guerra menos irónica, mas igualmente anti-bélica, é dada ao mundo por um também brilhante realizador, David Lean: The bridge over the river Kwai. A luz e a sombra da Humanidade tiveram também dois momentos cinematográficos distintos em 1957: a decência de Henry Fonda vence um grupo de homens empedernidos e preconceituosos em 12 angry men, mas ficasse na certeza de que o mundo do entretenimento é uma selva cínica e amoral com Burt Lancaster e Tony Curtis protagonizando The sweet smell of success. No resto do mundo, era um dos annus mirabilis de Ingmar Bergman, lançando Wild strawberries e o icónico The seventh seal, onde um jogo de xadrez com a Morte marcou a nossa imaginação colectiva. Fellini realiza The nights of Cabiria e no Japão, Kurosawa revela-se um amante de Shakespeare transformando Macbeth no extraordinário Throne of blood.
The graduate tenta seduzir-nos com a inteligência e humor de Mike Nichols e consegue, com a ajuda de Dustin Hoffman e Anne Bancroft inspirando Simon & Garfunkel; a paisagem do cinema norte-americano muda com Warren Beatty e Faye Dunaway correndo América numa onda criminosa interpretando Bonnie and Clyde. Os rebeldes ganham admiração por Paul Newman em Cool Hand Luke e o grupo de renegados que Lee Marvin reúne em The dirty dozen. Marvin era, já por si, um um epítome de coolness quando estreou, neste ano, Point Blank. A América ainda antes de ser pós-racial olha-se ao espelho quando Sidney Poitier e Rod Steiger fazem parelha policial em In the heat of the night, mas é em França que o Cinema aquece: Buñuel transforma Catherine Deneuve na Belle du jour que dá título ao filme; Jean-Pierre Melville, o grande cronista criminal do cinema francês, cria em Alain Dellon um ícone que inspiraria Jim Jarmush em Le samourai; e a derradeira grande obra de Jacques Tati, Playtime, divide o público.
A comunidade nerd mundial dava as boas vindas a uma obsessão que duraria décadas e George Lucas começava a virar as costas a ambições de cinema artístico e dando abraços a maços de notas: estreia Star Wars. O seu grande amigo Steven Spielberg lançava Close encounters of the third kind, numa outra vertente de ficção científica, igualmente lucrativa. Em Nova Iorque, John Travolta ginga ao som dos Bee Gees em Saturday night fever, enquanto que noutro canto da cidade um indivíduo bem menos gingão, mas infinitamente mais neurótico de seu nome Woody Allen inspira-se no seu romance com Diane Keaton para criar Annie Hall. Porque a normalidade é sobrevalorizada, este é o ano em que David Lynch se estreia com Eraserhead e o mundo dos sonhos nunca mais será o mesmo. Uma nova vaga de realizadores europeus surge para deixar marca: em Inglaterra, The duellists é a primeira obra de Ridley Scott, um homem que, num ano em que a ficção científica tem um boom, viria a marcar este género nos cinco anos seguintes. Dario Argento envolve o mundo cinéfilo nas suas obras de terror barroco com Suspiria e na Alemanha, Wim Wenders entra nas bocas do mundo com The american friend. No entanto, um dos grandes decanos europeus alcança finalmente um Oscar: Luis Buñuel vence a categoria de filme estrangeiro com Cet obscure object de desire e no seu estilo, atribui a vitória à honra dos membros da Academia a quem teria pago para obter o galardão.
Ano charneira para a Pop Culture mundial: McTiernan e Arnie andam pelas selvas da América Latina fazendo Predator, Paul Verhoeven anda pelas selvas de Detroit armando Robocop e Riggs e Murtaugh, sob a égide de Mel Gibson e Danny Glover, são uma “ethal weapon. Há histórias para mulheres ingénuas (o magnífico The princess bride) e um bocadinho mais obsessivas (Fatal Attraction ou como Glenn Close se tornou na pior inimiga dos coelhos). A guerra é vista como um elemento desumanizador e sem sentido – por Stanley Kubrick, em Full metal jacket -, como uma oportunidade para um radialista aliviar a dor dos soldados – Robin Williams à solta em Good morning, Vietnam – e uma boa oportunidade para crescer à força, assim se sobreviva aos japoneses e a John Malkovich – Spielberg em mais um exercício de seriedade através de Empire of the sun. Um outro colega de geração, Brian de Palma, tem, o seu maior sucesso comercial com The untouchables e por falar em bandidos, Oliver Stone induz em erro toda uma geração de yuppies com o mantra “Greed is good”, tirado do seu Wall Street. Steve Martin e John Candy passam uma véspera de Acção de Graças em Planes, trains and automobiles, mas não sofrem tanto quanto a pobre criança que fica à guarda de Magnum P.I, Sam Malone e Mahoney em Three men and a baby. Com mais sorte está o bebé que tem como pais Nicolas Cage e Holly Hunter na obra dos irmãos Coen Arizona Junior, enquanto que o seu grande amigo Sam Raimi revisita a sua primeira obra com uma sequela dopada até aos cabelos: Evil dead 2. A paixão está viva e recomenda-se, para bem de Patrick Swayze e Jennifer Grey em Dirty dancing, mas para desgraça, ou talvez não, de Bruno Ganz no belíssimo filme de Wim Wenders The wings of desire.
James Cameron prova que fazer uma sequela superior ao original nem é assim tão complicado quando realizada Terminator 2: Judgement day. Há partes pudendas para eles (hello, vagina de Sharon Stone em Basic Instinct!) e para elas (SPOILER!!!! Hello, partes pudendas de Jaye Davidson em The crying game!). Tarantino estreia-se com Reservoir dogs e inventa o adjectivo tarantinesco, criando uma moda e um bocadinho abaixo, no México, a sua versão mais serrabulho, Robert Rodriguez, passa as passas do Algarve para filmar El mariachi. 1992 é um ano de últimos: o último western de Clint Eastwood (essa elegia mágica que é Unforgiven); o último filme verdadeiramente memorável de Francis Ford Coppola (o excesso e homenagem ao Cinema que é Dracula) e também The last of the mohicans, a única vez que vimos Michael Mann filmando fora do espaço urbano e a última vez que Daniel Day-Lewis enveredou pelo cinema comercial. Houve também espaço para Cruise, Nicholson e mais algum “ew good men e outros homens menos bons e mais curtidos pela vida, destruídos por Alec Baldwin na cena inicial de Glengarry Glen Ross.
Paul Thomas Anderson anuncia-se ao mundo como génio precoce com Boogie nights e um precoce génio protagoniza também, ao som de Elliot Smith, Good Will Hunting. O excesso estava em todo o lado: “Titanic” ganha Óscares à bruta, Face/Off é uma cimeira de over-acting onde John Travolta e Nicholas Cage dialogam e Tarantino, que tem de exagero tudo, fez o seu filme mais sóbrio, Jackie Brown. A estrada reúne dois dos mais estranhos autores do cinema moderno: David Lynch entra numa Lost Highway e Cronenberg estampa-se na polémica do excelente Crash. Este é também o ano de L.A Confidential, off the record um dos grandes filmes da década e a melhor obra de Curtis Hanson e o segredo é a alma do negócia da sci-fi genética de Andrew Niccol Gattaca. A ficção científica mais leve é protagonizada por Will Smith e Tommy Lee Jones em MIB e esta ideia de extraterrestres pode acontecer no próprio interior dos seres humanos – é o que acontece em Deconstructing Harry (porventura a última grande obra do Woody Allen indomado) e no sucesso de culto e de charme de John Cusack que é Grosse Point Blank. A Orienta, Takeshi Kitano alcança sucesso internacional com Hana-bi, que prova que nem a Yakuza está à prova de melancolia, e os estúdios Ghibli dão lições com The princess Mononoke.