Entrevista


Anna Von Hausswolff

O “The Miraculous” é sobre um lugar onde passei muito tempo da minha vida, quer na minha infância, quer em idade adulta.


© Anders Nydam

Sueca, pianista, organista, compositora, Anna Von Hausswolff foi considerada uma das maiores surpresas de 2015 aquando do lançamento do seu terceiro álbum de originais “The Miraculous“. Dona de uma voz fantasmagórica e sempre em construção da sua identidade musical, vem este ano ao Amplifest apresentar o seu trabalho e nesta entrevista já nos promete que vai ser um concerto explosivo.

O Ceremony foi o teu primeiro trabalho que tive prazer de conhecer. A partir daí a curiosidade foi grande para saber o que já vinha de trás e com o The Miraculous essa curiosidade deu lugar a muito mais. A ideia que passas é a de um crescimento constante, uma maturidade e um trabalho cada vez maior em criares um caminho com base naquilo que ouvias e naquilo que ouves hoje em dia. Sentes essa evolução?

Fico muito feliz por saber que sentes um crescimento e uma maturidade no meu trabalho! Sou uma pessoa curiosa e tento sempre ir onde o meu coração me leva.

Qual sentes que será o caminho a partir daqui? Achas que esta identidade que criaste com o The Miraculous é uma identidade já completa daquilo que queres fazer no futuro ou ainda estás à procura desse caminho?

É certo que há certas escalas, melodias, harmonias e ritmos com as quais gosto muito de trabalhar e pelas quais tenho preferência em relação a outras, mas não sei bem qual a identidade da minha música neste momento ou que identidade ela terá no futuro. Aquilo que mais gosto na música, principalmente, é não fazer a mínima ideia onde ela me vai levar a seguir.

Através dos anos vamos ouvindo cada vez mais coisas diferentes e algumas bandas que nos influenciaram a determinado ponto da nossa vida deixam de fazer sentido. Que bandas te influenciaram no Singing From the Grave, no Ceremony e no The Miraculous? O que trouxeste do passado e o que ficou pelo caminho?

O Singing from The Grave saiu quando tinha 23 anos, mas algumas músicas desse álbum foram escritas quando tinha 15, por isso as influências são muitas. Quando andava na faculdade costumava ouvir Billie Holiday, Diamanda Galás, Björk, PJ Harvey, Jeff Buckley, Black Sabbath, The Smiths, The Cure e Radiohead e todos eles acabaram por me influenciar de alguma forma. O Ceremony saiu em 2012 e por essa altura andava a descobrir o Drone Metal e o Neo Folk e bandas como Earth, Sunn O))) e Of The Wand and the Moon que me influenciaram imenso e ainda hoje continuam a influenciar. Bo Hansson e Philip Glass são também dois compositores muito importantes e uma grande influência. Desde 2011 que também oiço outros tipos de metal, principalmente Black Metal. Quando andava a compor o “The Miraculous” ouvia Swans e György Ligeti e ainda continuo a ouvi-los muito. A minha banda favorita de momento é Tribulation.

Ouvi uma vez alguém dizer que se juntássemos a Kate Bush com os Earth daria Anna Von Hausswolff. O que pensas desta afirmação? O teu trabalho vocal tem influências da Kate Bush? Os Earth são uma influência quando compões?

Earth é uma das minhas bandas favoritas, mas não tenho qualquer interesse na Kate Bush, embora partilhemos algumas extensões vocais e a forma teatral como nos exprimimos.

Michael Gira, Iggy Pop, Stephen O’Malley, todos músicos brilhantes e todos seguidores e curiosos do teu trabalho. Como é sentir que alguns dos músicos mais conceituados e com tanta influência musical no público que os segue dá a conhecer o teu trabalho. Como é sentir que “atingiste” de forma tão positiva aqueles que são algumas das tuas influências?

É uma sensação inexplicável. Leva-me a acreditar que o mundo está cheio de coisas maravilhosas e que tudo é possível. Em Outubro irei fazer uma digressão europeia com Swans durante um mês e estou super nervosa!

A sensação com que fico sempre que ouço o The Miraculous é que todas as músicas do álbum representam um todo, quase como uma história que é contada do princípio ao fim com algumas músicas que servem de introdução para o que vamos ouvir a seguir. Poderias fazer-nos uma breve explicação do que representa este disco?

O “The Miraculous” é sobre um lugar onde passei muito tempo da minha vida, quer na minha infância, quer em idade adulta. A imaginação que lá se cria e a natureza servem de inspiração à criatividade. É impossível visitar este lugar e não ser automaticamente atingido por aquela aura. É um lugar com uma história fascinante em que a linha que separa a fantasia da realidade é ténue, o que torna difícil perceber o que é realmente verdadeiro e o que não é. A natureza juntamente com a profundidade emocional das histórias fazem deste lugar um sítio mágico e por isso decidi fazer um disco sobre ele.

Todas as letras do álbum são inspiradas em histórias que me foram contadas sobre este lugar e a minha percepção dele. Eu queria de alguma forma transportar para as letras a atmosfera que essas histórias criam e é por isso que elas são tão abstractas e estão tão fragmentadas. As letras são sempre muito importantes para mim, mas não quero que elas dominem a paisagem em demasia. Gosto de manter as coisas simples de forma a que as imagens evocadas sejam igualmente criadas por sons e palavras.

A “Come wander with me” é uma música muito especial e de todas as versões que alguma vez ouvi, a tua consegue criar uma aura que lhe confere um sentimento e uma grandiosidade difíceis de igualar. Como surgiu a ideia de fazer uma versão dessa música? O que representa para ti?

Um amigo enviou-me essa música e adorei-a. Comecei por fazer uma versão mais pequena em forma de balada, mas ela acabou por crescer de forma diferente. Vejo esta música tanto como uma sedução como um desapontamento ou medo de nos perdermos para um mundo que desejamos. Há uma parte sobre desejar e sonhar e depois há outra parte cheia de frustrações pelas limitações físicas e emocionais de nós mesmos.

Anna-Von-Hausswolff

Vi há pouco tempo um vídeo arrepiante da Evocation no concerto do Orgelkraft Festival e vi que durante o concerto há sempre trocas de sinais entre a ti e o resto da banda para entradas certas. Como funcionam como banda? Ensaiam em conjunto regularmente? Qual é a sensação de tocar numa igreja e num orgão de igreja versus tocar numa sala de concertos?

Não gosto muito de ensaiar. Não tenho paciência para tocar a mesma coisa uma e outra vez, gosto de tocar as músicas uma vez para que a adrenalina nunca desapareça. Gosto quando não tens a certeza absoluta de como as coisas vão correr durante um concerto. Há algumas partes nas minhas composições que estão sempre abertas ao improviso e são nessas partes que posso fazer experiências e tentar coisas novas, são essas partes que me fazem crescer como compositora.

A adrenalina que sinto ao tocar num órgão de igreja é a mesma que sinto quando toco numa sala de concertos. Aquilo que posso dizer é que tocar num órgão de tubos, com as costas voltadas para o público é uma experiência mais introvertida, enquanto que tocar numa sala de concertos e encarar o público de frente é uma experiência mais extrovertida. Não prefiro uma à outra.

Todos os anos, a Amplificasom, organizadora do Amplifest onde vais estar presente, faz um top 10 dos melhores álbuns desse ano com base na votação do público que está presente nos concertos que esta organiza. O The Miraculous fez parte do top 10 de 2015, o que prova que muita gente em Portugal votou nele como um dos melhores do ano. Tinhas ideia de ter seguidores em Portugal?

Não fazia ideia! Nunca toquei em Portugal antes, mas saber isso deixa-me super entusiasmada por ir aí e conhecer as pessoas que têm apoiado o meu trabalho.

Já tinhas ouvido falar do Amplifest? O que esperas encontrar e o que o público pode esperar da tua estreia no nosso país?

Penso que sim, que li algures sobre o festival, e tenho a certeza que cheguei a ver o alinhamento de outros anos. Espero encontrar bom vinho e pessoas felizes. E vocês podem esperar um concerto explosivo. Vou fazer a sala rebentar!


sobre o autor

Claudia Andrade

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