Entrevista


Japandroids

Se as músicas não fazem parte do alinhamento, é porque não eram assim tão boas.


© Leigh Righton

Entre Junho e Agosto, os Japandroids, canadianos que prometem salvar o college rock, tocaram três vezes em Portugal e todas no querido norte do nosso país. Acabaram uma tour no NOS Primavera Sound, num daqueles concertos que mantêm a velhice à distância, presentearam o público do Maus Hábitos com um concerto-surpresa intimista, e aqueceram o palco principal de Paredes de Coura.

Na bagagem trouxeram três discos, incluindo o recém-lançado “Near to the Wild Heart of Life”. Não me posso confessar fã de primeira linha de Japandroids, acompanho a carreira do duo à distância mas com muita admiração. Em palco, transmitem uma energia muito intensa e uma joie de vivre que dá vontade de pegar uma guitarra e apanhar a estrada. São rockers como já não se fabricam, e até acho que deveriam cunhar o seu estilo como celebration rock.

Na sua passagem por Paredes de Coura, estive à conversa com Brian King e David Prowse. Apaixonei-me pelos dois, claro está, pela simpatia e disponibilidade, pela “bacanidão” que surge tão naturalmente como a sua música.

A conversa começou da forma mais óbvia: pelo regresso a Portugal num tão curto espaço de tempo.

«Confesso que ficámos muito surpreendidos porque depois de tocar num festival numa cidade, não é comum tocar noutro. Mas convidaram-nos para regressar ao Porto e aceitámos, claro. Entre Junho e agora, ainda completámos uma tour pela Austrália e Nova Zelândia. O ano tem sido passado assim, na estrada.»

Ok, aqui não tive coragem de dar uma lição de geografia, mas só porque os +100 km que separam Porto e Paredes de Coura são peanuts para quem vive na América do Norte. Mas aproveitei para perceber se estas voltas ao mundo lhes permitem conhecer música nova e recomendável.

«Sim, acontece, às vezes conseguimos apanhar cenas novas. Nos concertos que fizemos recentemente na Austrália, tínhamos uma banda diferente a abrir a cada noite. Na Nova Zelândia conhecemos os Yukon Era e gostei muito deles. Também tocámos com os Wax em Brisbane. São muito cool e agora são a banda favorita do nosso técnico de guitarras.

Com sorte, também dá para ver outras bandas. Algo que acontece frequentemente, especialmente em festivais, é que nos encontramos com amigos. No Primavera tocaram os Operators, que são nossos amigos e acabámos por curtir um pouco com eles. Sei que os At The Drive In tocaram cá ontem à noite [em Paredes de Coura], e nós vamos acabar por ter uma data com eles nesta tour, já na Alemanha.»

Para além destes encontros casuais, em Outubro os Japandroids juntam-se ao Cloud Nothings para uma tour pela América do Norte.

«Vamos fazer uma tour gigantesca com eles. Somos todos amigos e já tocámos juntos. Vai ser como um grandioso rock show, porque apesar de as bandas não serem a mesma coisa, muita gente gosta de ambas. Aliás, é provável que quem gosta de Japandroids também curta Cloud Nothings.»

Apesar de terem sonoridades ligeiramente distintas, são muitos os pontos de união entre os canadianos e os rapazes de Cleveland, especialmente a forma como conseguiram recuperar o interesse pelas guitarras tocadas com o volume no máximo no início desta década, naquela a que alguém chamou de “onda grunge millennial” (é possível que esse alguém tenha sido eu).

O disco “Near to the Wild Heart of Life” foi editado pelos Japandroids no início de 2017, e do ponto de vista de produção acabou por ser o seu trabalho mais inovador, até ao momento.

«Foi um processo muito diferente. Nos álbuns anteriores, as músicas foram escritas para serem tocadas ao vivo e depois acabámos por as gravar exactamente da mesma forma. Desta vez não tocámos nenhuma das músicas para o público antes de irmos para estúdio, o que nos obrigou a reflectir sobre as gravações e como as iríamos tocar ao vivo, como iriam soar, o que deveria ser mudado. Demora um certo tempo para decidir como será a melhor versão ao vivo de cada tema. E para nós é algo diferente.»

Não deixa de ser curioso que para os Japandroids o processo tradicional de gravação seja inovador. Mas porque optaram por uma abordagem diferente?

«Bem, durante muito tempo fizemos a mesma coisa e somos bons a fazê-lo, as pessoas gostam. Mas sentimos que começámos a perder o entusiasmo. É muito fixe quando começamos algo de novo, mas após alguns anos e álbuns, já não tem a mesma magia. Por isso esta foi uma nova e entusiasmante forma de abordarmos a escrita e gravação, e abriu-nos muitas portas.

A melhor parte disto tudo, é que quando tens uma música editada mas que nunca foi tocada ao vivo, tu não fazes ideia de como é suposto soar ao vivo. Deixa espaço para experimentar, para testar a forma mais perfeita para a tocar no palco. Há um certo caos, uma dose de desconhecido, que trazem um certo equilíbrio.»

Na sua primeira passagem por Portugal em 2017, em Junho no Primavera Sound, os Japandroids revelaram aos fãs que o teledisco para “North East South West” estava a ser rodado no Porto. O orgulho tripeiro resultou numa ovação apoteótica.

«Nós só fizemos um videoclip, e foi para The House That Heaven Built. Nunca fomos uma daquelas bandas interessadas em vídeos com narrativas independentes da música, ou em que há actores a desempenhar papéis, nem nada do género. Mas queríamos fazer um vídeo conceptualmente semelhante ao anterior, que tinha sido filmado em Toronto, Chicago e Nova Iorque. Então surgiu a ideia, e se fizéssemos um vídeo da tour pela Europa?.

Foi uma tournée muito fixe, tocámos em sítios que – para nós – são exóticos, achámos que deveríamos documentar. Foi provavelmente a tour mais divertida que tivemos neste disco. Visitámos cidades lindas, tocámos em festivais e salas, foi um óptimo equilíbrio.»

Entretanto o vídeo já está disponível e podem ver esta declaração de amor ao Porto aqui.

Na despedida, veio o abraço e surgiu a pergunta inevitável. Mas afinal, digam lá amigos Japandroids, já que os vossos álbuns têm sempre apenas oito faixas, ponderam editar uma colectânea de b-sides e temas esquecidos? A verdade é que não, disseram-me.

«As músicas são escritas num determinado tempo e não faz sentido recuperá-las mais tarde. Podemos até repescar alguma e dar-lhe uma volta, mas não é a mesma coisa. E os fãs podem ficar descansados: se as músicas não fazem parte do alinhamento, é porque não eram assim tão boas. Damos as nossas melhores, não estamos a guardá-las para nós.»


sobre o autor

Isabel Leirós

"Oh, there is thunder in our hearts" (Ver mais artigos)

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