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2022 tem sido um ano de mudança, umas vezes brusca e noutras suave. Também a mudança passou pelos Linda Martini: lançaram um novo álbum, ERRÔR, e sofreram alterações na formação, com a saída de Pedro Geraldes, substituído por Rui Carvalho, mais conhecido por Filho da Mãe.
Falando do nosso caso, conhecemos e seguimos a banda há coisa de dezassete anos, quando ainda eram um quinteto. Se os fomos acompanhando umas vezes com maior interesse do que outras, certo é que reconhecemos que os Linda Martini já se conseguiram transformar numa instituição da música popular nacional, sem jactância e com uma proximidade com os fãs e um sentido de missão artística que lhes vai renovando a relevância.
No périplo courense deste ano (onde a banda tocou pela quinta vez), fomos falar com a banda de Lisboa, que actuou ou, melhor dizendo, partiu a casa ao meio e deixou um rasto de pó, fumo e gente satisfeita no primeiro dia de festival, dedicado inteiramente a artistas nacionais. Falámos sobre histórias dos seus membros no festival, a sua dinâmica criativa (em particular neste seu novo disco), sobre os seus prazeres proibidos e sobre críticos especiais de videoclips. Enérgicos com esta ronda de ERRÔR, parecem putos que não têm aulas amanhã. Ei-los.
Linda Martini, contem-nos as vossas histórias enquanto espectadores e banda que tocou em Paredes de Coura.
Hélio Morais (HM): O André, da primeira vez que cá veio, sonhou em vir cá tocar no ano seguinte e aconteceu.
André Henriques (AH): Nesse ano vi a Karen O dos Yeah Yeah Yeahs esmagar um ananás na cabeça e fiquei impressionado. Não sei se estava pré-furado, mas é difícil esmagar um ananás. Ela esmagou o ananás todo, foi impressionante!
HM: Depois tocámos com Sonic Youth e também foi engraçado. Senti-me muito estúpido por não ter falado com eles, não queria ser mais um a incomodar, mas depois mandei-lhes mensagem no MySpace e eles responderam. Senti-me mais estúpido ainda.
AH: Olha, outra! Não sei qual é que foi o dia em estávamos a tocar e, numa parte qualquer instrumental, estou a olhar para o público e de repente há um chavalo a fazer assim [faz gesto de apontar para o lado] e quem era? Era o Adolfo que estava ao lado dele e o puto estava a chamar-me para dizer que estava lá o Adolfo Luxúria Canibal para eu conhecê-lo. Era tipo o selo de aprovação dos mais seniores. Está aqui o padrinho!
Avançando para o vosso novo disco, o ERRÔR. Um disco a nosso ver mais aventureiro do que o homónimo. Qual foi o processo criativo neste disco?
Cláudia Guerreiro (CG): Ultimamente temos adoptado o processo de “vamos para fora, vamos fingir que não temos uma vida e família e vamos criar”. Antigamente fazíamos a coisa na sala de ensaio, a sala onde temos as nossas coisas e desde o Linda Martini decidimos ir para fora e passar assim uma ou duas temporadas em residência. E foi o que fizemos para este, também. Normalmente, reagimos ao disco anterior e portanto acho que como reacção ao disco anterior procurámos alguma coisa mais desacelerada, mais parada, mais densa, mais pesada.
Sendo difícil evitar o cliché, podemos dizer que se reinventaram?
CG: Eu acho que tentamos sempre reinventarmo-nos a cada disco que fazemos. O que conseguimos e o que não conseguimos não sei, acho que depende sempre de quem ouve. Para nós, sim, acho que conseguimos fazer algo diferente daquilo que já tínhamos feito, não sei é se é propriamente reinventarmo-nos.
Neste momento estão em digressão de promoção do ERRÔR. Que tal tem corrido? Do que vimos há pouco da vossa actuação, parece-nos mais abrasivo.
CG: Tem corrido muito bem. Essa parte mais abrasiva tem a ver com o disco e o resto é uma reinterpretação. A partir do momento em que deixámos de contar com o Pedro [Geraldes, que deixou a banda em Fevereiro deste ano] na banda, a nossa ideia não é pôr uma pessoa a fazer exactamente aquilo que ele fez. A verdade é que o disco nunca tinha sido tocado ao vivo e portanto quando ele é tocado pela primeira vez pode ser apresentado de uma forma diferente daquela que foi gravada. E termos uma pessoa nova, neste caso o Rui [Carvalho, mais conhecido como Filho da Mãe] a tocar connosco, acho que faz todo o sentido adaptar a coisa à pessoa que está connosco.
Uma simbiose, portanto.
CG: Sim.
Presumimos que têm andado em digressão numa carrinha. Têm algum guilty pleasure para ouvir na carrinha?
HM: Na verdade falamos imenso e ouvimos pouca música.
AH: No outro dia ouvimos o novo de Scorpions!
CG: É verdade, estava a ver se não era eu a dizer isso! (risos)
AH: Pessoal da nossa equipa estava a dizer que era do caraças e que têm de o ouvir…
Rui Carvalho (RC): Não ouvimos Quim Barreiros, não ouvimos nada disso. Ouvimos o novo de Scorpions.
CG: Não foi propriamente um guilty pleasure. Foi um guilty, esquece o pleasure! (risos)
HM: Hoje estava a ouvir um concerto de Dua Lipa.
CG: Eu gosto é da Dua Lipa!
RC: A gente ouviu isso na carrinha, também lá passou. Não sei se é guilty pleasure, mas é guilty alguma coisa.
CG: Se calhar aí já é mais pleasure do que guilty!
Se pudessem curar um festival, qual seria o cartaz?
HM: Para começar, muita gente que está cá hoje.
CG: Se fosse curadora de um festival teria de te pedir mais tempo, que isso não se decide assim num minuto! Senão não sai nada de jeito! (risos)
HM: Pegando agora nos afectos mais do que noutra coisa, poria Nueva Vulcano que é a banda do Santi Garcia, que produziu o nosso disco. Nueva Vulcano? Não, estou maluco. No More Lies, isso sim.
RC: Não punhas These Arms [Are Snakes]? Eu gostava de ver outra vez.
HM: Punha These Arms. E punha Blood Brothers outra vez.
CG: Se calhar punhas Metz.
HM: Metz também se mete.
CG: Pronto, estás a ver que somos aqueles gajos que não põem bandas portuguesas. Somos os gajos que não põem música portuguesa no festival!
HM: Punha o Chinaskee, que dá um grande concerto. Punha o Vaiapraia.
CG: E não punhas o Filho da Mãe, pá?!?! (risos)
Fazer assim como que um dois em um?
HM: Não, que ele depois ficava com a mão cansada e não podia tocar connosco!
CG: Não, ele tocava no dia seguinte!
HM: Quem é que eu punha mais? Olha, punha Rita Vian, que tocou antes de nós, também.
RC: Grande concerto.
HM: Sei lá, tanta coisa. Tens tanta banda boa. Qual é o orçamento que eu tenho? Essa é que é a pergunta.
CG: (risos)
Cinco milhões de euros e não se fala mais nisso.
RC: Ei, isso dá para muito.
CG: Quanto é que leva Metallica?
HM: Não punha nenhuma dessas, essas não precisam de estar num festival curado por nós.
RC: Estamos a deixar o Hélio muito preocupado, ele vai ter de pensar muito nisto.
CG: Com cinco milhões será que a gente conseguia pôr aqui Nirvana?
Com holograma deve dar.
CG: Trazer um morto de volta! Se calhar cinco milhões não chega, que o dinheiro não compra tudo, não é?
Eu Nem Vi e Horário de Verão, canções de ERRÔR, têm já videoclips. Para além de vocês, outros vultos, Beavis & Butt-Head, regressaram este ano. Gostavam de ter um videoclip vosso comentado por eles?
AH: Ei, isso era lindo. Eu era muito fã daquilo, quando na altura da MTV tinhas pouco acesso a informação na era pré-Internet e aquilo, sendo programa de palhaçada, era um programa de comédia, mas tu apanhavas lá coisas que não vias em lado nenhum e, de repente, os gajos gozavam com um excerto de dez segundos e tu “que é esta merda???”
Depois a gente via o nome da banda e da canção e ia à procura.
AH: Vias o nome e ias à procura. Eles agora vão fazer um filme, não é?
Vão fazer um filme e vai haver episódios novos.
AH: Claro que sim. Sou um miúdo que cresceu a ouvir música dos anos noventa.
HM: Por acaso acho que preferia ter um vídeo comentado por quem fazia a voz do Ren & Stimpy [Ren: André Maia; Stimpy: Rui de Sá], acho que gostava mais disso.
RC: Estou de acordo. Completamente.
CG: Pivete! (imita a voz do Stimpy, risada geral)
AH: Ah, mas os que faziam a dobragem.
RC: REEEEEEN! (imita também a voz do Stimpy, risada geral)
HM: Como é que aquilo passou na televisão? Aquilo era bué da agressivo, meu!
[Queda da barreira e perda de objectividade entre entrevistador e entrevistados, visto que começou toda a gente a imitar o Ren e o Stimpy]
Ainda por cima era ao sábado de manhã…
AH: Alguém estava distraído. O provedor estava distraído.