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O quinteto de pós-rock Then They Flew editou no final de 2015 este “Stable as the Earth Stops Spinning“, com as cinco músicas que o compõem a serem gravadas e masterizadas no Menos Um Studios. Aqui a banda apresenta-as faixa a faixa e no próximo dia 3 de Fevereiro poderão ouvi-las ao vivo no Maus Hábitos, no Porto, na festa de aniversário do Bran Morrighan.
A música que dá início ao álbum foi a primeira que o Marcos compôs com os Then They Flew em mente, antes sequer da banda ter nome. O processo criativo foi influenciado pela leitura de um romance histórico passado durante a primeira guerra mundial (como denota o nome da faixa), que deu vontade ao Marcos de contar uma história. Esta, estrutura a composição dos vários momentos da música, acompanhando os milhares de jovens e homens que, após uma infância ou juventude tranquilas, foram chamados a combate e sentem um emocionante entusiasmo inicial. Mas, após reverem melhor a sua situação, esse entusiasmo transforma-se no receio do avizinhar da violência e da luta pela sobrevivência, até que dão por si no campo de batalha, onde centenas de milhares de soldados acabaram por perecer. No entanto, a representação não é apenas de uma guerra externa, de matar e morrer, mas também de guerras internas e pessoais, ou de outras provações que exijam sangue, suor e lágrimas.
A estrutura da La Lys, exatamente por pretender mostrar a progressão numa história, não tem refrões nem repetições de tema. Não obstante, o facto do ritmo, da melodia e da harmonia não divergirem muito ao longo do tema, quer dar a ideia da história ser contada frontalmente, sem grandes rodeios ou eufemismos. É directa como a realidade do confronto num campo de batalha.
Escrita também pelo Marcos, com ligeiros arranjos e re-instrumentação dos restantes elementos, apareceu alguns meses antes de entrar na banda, logo após regressar de umas férias na Finlândia. Como diz o povo, o que acontece num telhado da Finlândia fica nesse telhado da Finlândia, e o que lá lhe aconteceu pôs-lhe a cabeça a fervilhar de ideias ainda no voo de regresso. Quando chegou a casa não perdeu tempo para começar a desenvolvê-las e a gravar instrumentos. Nos dois ou três dias de férias que lhe restavam já tinha uma versão rudimentar gravada, mas sem um fim destinado. Pouco tempo depois encontrou um anúncio a pedir um baixista de post-rock e foi com essa demo que quis impressionar quem estava do outro lado.
Obviamente resultou. Embora não tivesse tido qualquer preocupação em construir uma música que fosse executável por cinco elementos ao vivo, o acerto foi directo e ficou como está hoje, talvez a música mais introspectiva do álbum e com uma toada mais melancólica que a La Lys. Segue uma estrutura característica do post rock, cujo auge é relembrado por uma réplica de menor intensidade. Não fosse esse uma das restrições da memória, e não fosse a memória a preocupação da história (La Lys).
Mais combustão que explosão, tal como o segmento central do álbum ao qual dá entrada, e que se estende até meados da An Enemy Will Bring Us Together. O terraço que lhe dá nome e a chuva que se ouve no princípio e no fim ficaram em Helsínquia, mas este Rooftop ficou aqui no Stable as the Earth Stops Spinning.
Esta veio da mente criativa do Tiago, ex-guitarrista e membro fundador da banda, corria o longínquo ano de 2012. É o tema mais antigo do álbum.
O Tiago descreve o seu conteúdo como algo mais visual do que propriamente uma história. Foi escrito num quarto de arrumos mal iluminado, recheado de caixas de cartão e velharias, durante uma tarde incógnita que tardava em passar, e que conduziu à união das imagens sonoras com os sentimentos. Entretanto, acabou por passar por várias transformações, influenciadas pela ligação que cada membro acabou por criar com o tema e, já passados estes anos todos, até o Tiago criou uma relação diferente.
Inicialmente era mais bluesy, com guitarras e baixo sem distorção e muito percussivos. Não tinha o tom épico que ganhou com a distorção nas guitarras, o baixo fuzzy e contínuo e a dinâmica da bateria. A secção do meio é um interlúdio de improviso. Na gravação do álbum, o microfone de sala captou por acidente a guitarra do Tiago, ficando com um timbre rústico interessante, a fazer lembrar as raízes mais cruas e originais do tema. O título duplo vem dessa génese dupla da canção: primeiro pelo Tiago e depois pela banda.
Foi um tema muito difícil de compor, que levou muitas horas, muita discussão, e muitos ensaios. O Tiago confessa que, quatro anos depois, sempre que o ouve, surge uma lágrima ao canto do olho e um grande sentimento de orgulho. Mas o Tiago é aquele sentimentalão à antiga! Abraço, Tiago!
A “Enemy” é a transição para o peso do terceiro acto do álbum. Há um drone distante que alerta o ritmo da bateria (coração?), gradualmente progredindo. As guitarras vão aparecendo em resposta e contra-resposta, com várias melodias e apontamentos rítmicos, e a percussão carrega as texturas para a frente. Nessa fuga, há um momento de serenidade para recuperar o fôlego e planear melhor a saída. Só que os planos nem sempre correm como queremos…
Enquanto estava a ser trabalhada em ensaios, quisemos levar o final para outro nível ao adicionarmos uma gigantesca parede de ruído, que engoliria por completo qualquer instrumento. Resolvemos contrapor esse caos com um delicado arranjo de cordas, relembrando o que havia antes do caos, uma vez que a baleia sonora morresse.
Foi composta maioritariamente pelo Bernardo, que revê nesta música vários sentimentos de ansiedade e revoltas sem rosto com os quais as pessoas lidam diariamente. Aqueles pequenos equívocos e frustrações que às vezes mostram uma miragem de desespero. O título reflecte uma mensagem de esperança contra este inimigo comum, porque, no fundo, daqui ninguém sai vivo e apenas juntos aguentamos a viagem.
O fim do álbum resultou da primeira jam de sempre da banda, poucos minutos após alguns dos membros se terem conhecido. Assim, este fim simboliza o início dos Then They Flew como um colectivo criativo. No ficheiro está escrito “25 Junho de 2013”, a primeira vez que nos juntámos numa sala de ensaio. O riff principal surgiu dos dedos do Pedro, ex-guitarrista, e os restantes membros pegaram a partir daí, e o resultado foi uma gravação crua de alguns minutos. As várias ideias musicais dessa improvisação foram depois trabalhadas, culminando numa representação musical coesa da energia dessa jam. O riff da segunda secção, onde temos o crescendo com os instrumentos desfasados, foi uma ideia do Tiago inspirada em Mogwai, para quem vão as nossas vénias. Poliritmia que lentamente converge numa apoteose.
No início, ouve-se ainda o violoncelo no final da “Enemy”, e samples da voz do gigante de Twin Peaks, quando este revela ao Agent Cooper, numa visão após este ser atingido, pistas importantes sobre Laura Palmer. Este é um momento de viragem e de reafirmação da resiliência de Cooper na investigação que, de certa forma, é paralela ao que queremos que Stable as the Earth Stops Spinning represente. O título presta homenagem a esta obra de David Lynch, casando bem com o carácter nocturno e sombrio do tema.
A Arte-Factos é uma revista online fundada em Abril de 2010 por um grupo de jovens interessados em cultura. (Ver mais artigos)