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Hayao Miyazaki é um nome incontornável da animação japonesa e mundial, que durante décadas e décadas tem continuado a encantar um público diversificado, maioritariamente adulto com as suas obras aparentemente naïfes e em forma de fábula infantil, reveladoras de uma destreza apurada e simplicidade singulares na arte de contar e dar vida a uma história.
Uma das características mais ímpares de Miyazaki como contador de histórias, é a sua peculiar fusão narrativa e estética entre o surrealismo poético e a vasta mitologia japonesa, aliada a temáticas universais inerentes à essência humana. A Viagem De Chihiro é um perfeito exemplo desta tipologia, através de uma saga em forma de epopeia de uma menina de 10 anos (Chihiro), num mundo muito diferente do seu: uma cidade onde os humanos são um petisco para os seus habitantes e são transformados em porcos para deleite da sua líder Yubaba, uma aparentemente terrível feiticeira e dona de uma casa de banhos para deuses. Com esta premissa deliciosamente estranha (que relembra a obra de Lewis Carroll em muitos aspectos), Chihiro tenta salvar os seus pais transformados em porcos num local no mínimo exótico, onde irá ultrapassar vários obstáculos e travar-se com diversos antagonistas, como também encontrará aliados – um maralhal de personagens fantasiosas, bem vincadas e ambíguas na sua natureza e, tal como a Alice de Lewis Carroll, esta experiência bizarra irá transformar a sua forma de agir e ver o mundo.
A fantasia funde-se com a realidade, através de uma narrativa que sem ser frenética consegue ser veloz no desencadear do desenvolvimento, conseguindo a proeza da sua complexidade conceptual agarrar o espectador e fazê-lo entender que a aventura de Chihiro como uma metáfora de todas as aprendizagens necessárias para a vida adulta, sem chegar a ser moralista ou paternalista, mas simplesmente honesta e livre na sua recriação. Outra marca registada do realizador é a animação primorosa nos detalhes, com um cunho realista e clássico, no entanto, devido à sua natureza sobrenatural repleta de deuses monstruosos, fantasmas e outros seres tais, a obra possui uma componente gore marcante que causa estranheza e em outras situações asco, em que o feio possui o dom de se tornar contemplativo e até belo. O cinema de animação é muitas vezes rotulado de uma forma superficial de ser um género cinematográfico de segundo plano, virado para o público infantil ou até acusado de ser isento de profundidade, Miyazaki consegue de uma forma magistral demonstrar o contrário e elevar o cinema de animação a outro nível.
A Viagem de Chihiro é a prova cabal – uma obra-prima que ultrapassa os elementos e detalhes visuais, recorrendo aos sentimentos primários do Homem, sem perder uma essência infantil que muitas vezes é esquecida e não valorizada como deveria ser.
Crítica de Paulo Lopes
A Arte-Factos é uma revista online fundada em Abril de 2010 por um grupo de jovens interessados em cultura. (Ver mais artigos)