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Estreado no Festival de Cinema de Sundance no início de 2017, o terceiro filme da chamada ‘trilogia do desejo’ de Luca Guadagnino parte da obra homónima de André Aciman, aqui fielmente adaptada ao cinema pelo consagrado James Ivory. O romance acompanha, durante 20 anos, o caso de amor entre um jovem de 17 anos e um assistente universitário sete anos mais velho. Em Call Me By Your Name acedemos apenas ao seu encontro, um primeiro Verão passado na Itália dos anos 80. De férias na sumptuosa residência rural da família no norte italiano, a vida de Elio (Timothee Chalamet), altera-se radicalmente com a chegada de Oliver (Armie Hammer), convidado pelo pai do rapaz (Michael Stuhlbarg), um respeitado professor de arqueologia, a ajudá-lo na sua investigação académica durante os meses estivais. A aparência jovial e cosmopolita de Oliver atrai todos os que com ele se cruzam, embora Elio inicialmente se sinta pouco à vontade com o convidado. Mas aos poucos, também ele se rende aos encantos de Oliver, de forma inesperada para ambos.
Guadagnino recria a transformação da relação com uma espécie de ‘singeleza erudita’. Não estamos a falar de um primeiro amor que segue cânones tradicionais, mas antes de um romance entre dois homens (algo que facilmente arredaria o filme para um segmento comercial específico) que se desenvolve num contexto particular: uma família instruída e multicultural, que fala várias línguas com igual fluidez, recebe convidados de várias origens e credos e onde não há lugar a rótulos ou interdições (uma família moderna, portanto, que deseja que a cria experimente livremente as suas emoções). Em nenhum momento o despertar de Elio para aquela paixão é considerado estranho ou desviante, apenas natural. A imersão do romance neste contexto burguês evita desde logo a tendência para um posicionamento do espectador relativamente à temática da homossexualidade – porque a ultrapassa – possibilitando uma experiência mais directa da história e do seu impacto emocional.
O ritmo do filme desempenha também um papel fundamental neste propósito. As personagens são gradualmente apresentadas – a juventude de Elio vs. a experiência de Oliver (embora a referência à diferença exacta das idades seja evitada) – para que aos poucos nos identifiquemos com elas. A placidez do cenário (as belas paisagens de Crema, captadas pela fotografia de Sayombhu Mukdeeprom) e a atmosfera indolente, que balança entre uma certa intelectualidade e um lazer permanente e descomprometido, ajudam a realçar o desenvolvimento lento da relação entre Elio e Oliver, que passam cada vez mais tempo juntos e descobrem interesses comuns: a música, a literatura, as refeições ao ar livre e os passeios de bicicleta, os namoriscos com as raparigas (um pequeno papel de Esther Garrel), a sensualidade helénica de uma estátua recuperada do fundo de um lago durante as pesquisas arqueológicas do pai de Elio. Os diálogos de James Ivory são propositadamente velados e discretos. Muito do que se acontece permanece no subtexto (ainda que haja momentos de diálogo muito ricos), num dueto pausado de aproximação e fuga. O resultado é um conto coming-of-age simultaneamente banal e extraordinário, onde tudo acontece enquanto nada acontece.
No papel de Elio, Timothée Chamalet é a grande revelação do filme. Com apenas 22 anos, o actor mostra uma versatilidade rara à qual acresce uma naturalidade impressionante e ainda a capacidade de tocar piano e viola e falar italiano ou francês. A química com Armie Hammer é plenamente conseguida e as performances dos dois actores equilibram-se na perfeição. Amira Casar e Michael Stuhlbarg brilham também nos papéis dos pais de Elio, em particular Stuhlbarg, protagonista de um monólogo final que acaba por ser um dos momentos altos do filme. Por fim, refira-se a belíssima banda-sonora de Sufjan Stevens, a funcionar como uma espécie de cápsula temporal que captura a ambiência dos anos 80. O tema final, Visions of Gideon, fica instantaneamente na memória.
Nomeado para os Golden Globes 2018 nas categorias de melhor filme, melhor actor (Timothée Chalamet) e melhor actor secundário (Armie Hammer), Call Me By Your Name não é apenas um dos filmes-surpresa do ano, mas também um dos mais abrangentes. Para românticos incuráveis, sem dúvida, mas também para amantes das artes, activistas (embora não seja um filme gay, será natural que inspire uma certa militância) e sobretudo para cinéfilos. Um romance dramático inesperado, filmado com doses iguais de erotismo e de silêncio, extroversão e elegância.