Argentina, anos 80, transição da ditadura para a democracia. É neste período que estamos, mas O Clá apresenta-nos uma visão peculiar sobre os trágicos anos da ditadura. Não acompanhamos a repressão do regime, a tortura, os raptos, os desaparecimentos bruscos, mas sim quem aproveitou o clima de medo e de um certo caos para desecandear, por conta própria, as suas próprias acções criminosas.

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No caso, acompanhamos a família Puccio. Não só as actividades criminosas do Don Corleone argentino (com uma malícia serena muito bem captada e interpretada por Guillermo Francella), mas o ambiente familiar propriamente dito. Ou como a normalidade se mistura com o crime e, nesse aspecto, há uma cena na fase inicial, num travelling ao longo da casa, que expõe o contraste entre as duas realidades de forma muito eficaz.

Os raptos e os pedidos de resgate são cometidos com uma facilidade e um descuido assombrosos.  E não será por falta de realismo do argumento. Bem pelo contrário. Expõem, sim, tempos de absoluta impunidade, de implacável condescendência judicial, que permitia que tudo fosse feito de forma pouco “profissional”. E, enquanto os acompanhamos, vamos escutando algum rock britânico (pois, as Malvinas…), com destaque para “Sunny Afternoon” dos Kinks, o que lhe dá um contraste curioso.

Faltará ao filme de Trapero, vencedor do Leão de Prata (melhor realizador) do Festival de Veneza de 2015, alguma contextualização histórica e alguma força psicológica, nomeadamente com mais momentos familiares que representassem melhor o envolvimento e as dúvidas dos filhos. Isso está lá, mas nem todas as personagens são exploradas convenientemente, como é o caso de Guillermo Puccio. Seja como for, O Clã é uma história escorreita e bem interessante, juntando os condimentos do clássico de gangsters com a descrição de um período negro da Argentina pela via de improváveis personagens.