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A melhor piada, para além de se engraçada, é aquela que não se espera; e ninguém esperava que o primeiro volume (a Marvel quer assim chamar-lhe, vou respeitar o desejo) de Guardians of the Galaxy fosse o imenso sucesso que revelou: críticas positivas por todo o lado, o maior box-office de 2014 e uma prova cabal de que o estúdio estava a entrar numa fase de trollar a concorrência. Este era, afinal, um título pouco conhecido do seu catálogo e muitos previram o primeiro flop da companhia, ainda por cima com um realizador inexperiente como James Gunn ao leme e uma árvore andante acompanhada por um guaxinim sarcástico a acompanhar. Mas resultou e muito devido ao efeito surpresa – era um filme bastante engraçado, com uma energia muito diferente no cinema comercial e a insistência em nunca se levar a sério sem abdicar de uma linha emocional que justificasse o investimento do espectador.
Chegado o segundo volume, acabou-se a surpresa e James Gunn, que regressa para a sequela, tenta recriar o que não pode ser recriado. O mais curioso do filme é que apesar de manter quase tudo o que o público adorou no primeiro – a banda sonora bem orelhuda e de época, a desgarrada conversa entre o bando de outsiders, sequências espaciais com algum surrealismo e um tom geral de comédia non-sense – é muito diferente em tom e propósito. A narrativa linear do primeiro é substituída no segundo volume por um conjunto de histórias pessoais ligadas entre si pelo tema da Família. A intenção é, talvez, desenvolver os personagens (principalmente Peter Quill, que aqui encontra um pai que todos queríamos, Kurt Russel), mas dá ao filme um ritmo desequilibrado, fracturado e quando se chega ao terceiro acto, personagens que são aqui importantes passam grandes períodos do filme sem aparecer ou sequer anunciar porque se tornam tão importantes. Há ideias temáticas muito boas aqui, principalmente a do pai de Quill e do que significa paternidade na sua vida, mas o seu desenvolvimento não é o melhor. As variações de tom são bruscas e por vezes deixa um sabor estranho na retina. Cada um dos membros dos Guardiões tem a sua pequena intriga a resolver e nalgumas, o sentimento subjacente é anunciado com a falta de subtileza que se espera no cinema comercial; no entanto, não só porque o nosso capital de simpatia para com os personagens é enorme mas também porque Gunn, não conseguindo aqui a mesma consistência da sua primeira obra, é excelente na captura das emoções em pequenos gestos, vinhetas e momentos, é algo de que o filme só se ressente depois de sairmos da sala de cinema e pensando sobre isso. Enquanto lá estamos, rimos e emocionamo-nos com o que se passa.
Guardians of the Galaxy: vol. 2 está muito melhor, aliás, quando navega sem qualquer tipo de propósito. Gunn adora estes personagens e escreve para eles como um pai extremoso e nesses momentos em que os membros da equipa discutem e barafustam que o entretenimento é total. Quando, como quase todos os filmes, se recorda de que deve haver uma história e um vilão, coxeia um bocadinho até final. O espírito algo anárquico mantém-se e isso que admiramos e gostamos neste cantinho da Marvel e que o torna bem diferente das outras sagas. Gunn não é brilhante visualmente, mas é particularmente inspirado, novamente, na recriação de um ambiente muito década de 70, desde as canções escolhidas (algumas delas inesperadas, outras que se adivinham a milhas: tentem descobrir, sem ver o filme, que tema desta década escolheu o realizador para um momento particular de amor entre pai e filho) até ao psicadelismo dos cenários e do ambiente espacial totalmente removido de qualquer realidade científica e colorido por um Universo que consome LSD. O planeta de Ego, o pai de Quill, é um perfeito exemplo disso.
O Drax de Dave Bautista é o grande MVP deste filme, ficando com as melhores falas e cenas (uma delas, “I’m greatly famous for my huge turds”, vai ser impressa em t-shirts, de certeza) e embora haja cameos bem engraçados (um deles é o de Sylvester Stallone, como anunciado, mas outra figura emblemática dos anos 80 dá um ar de sua graça), é o regresso de Yondu que deixa a maior impressão no tecido do filme. É inesperado, e a certo ponto parecem haver demasiadas figuras nas dua shoras de duração, mas Gunn vai balançando todas estas bolas e Yondu surge como uma surpresa emocional, com paralelos com outros personagens e juntamente com Drax e a fofura que é o Baby Groot, sai do filme como um dos grandes vencedores. Embora o apelo esmoreça em pontos, o final é, talvez, o mais emocional de qualquer filme da Marvel até à data e num ano em que Hollywood aprendeu, com Logan, que este género pode (e às vezes até deve) ser tão certeiro emocionalmente com qualquer outro, isto anuncia intenções interessantes para o futuro. Há um inesperado grande coração aqui que se sobrepõe ao resto e se entramos pela boa disposição, o que suporta o filme são os personagens, as suas relações, os seus problemas e um murro bem aplicado nas emoções.
Se o primeiro Guardians of the Galaxy venceu pelo inesperado da proposta, o segundo suporta-se pela surpresa das opções. Desequilibrado sim, mas nunca aborrecido e com a intenção sincera de dizer alguma coisa e de fazer de um bando de renegados uma família pela qual podemos nutrir uma genuína emoção. Por mim, tudo bem: se a mistura total é boa, ignora-se bem uma ou outra colherada mais azeda.