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Night of the Living Dead
Título Português: A Noite dos Mortos-Vivos | Ano: 1968 | Duração: 96m | Género: Terror
País: EUA | Realizador: George A. Romero | Elenco: Duane Jones, Judith O'Dea, Karl Hardman

Mais do que um clássico do cinema de horror, a Noite dos Mortos – Vivos de George Romero é a génese criativa e contemporânea do universo zombie. Um culto popular cimentado nestes últimos anos com a série televisiva The walking Dead, baseada na comic homónima de Robert Kirkman e Tony Moore, sem esquecer outras referências transpostas nas mais diversas áreas criativasv – sendo talvez o cinema o altar privilegiado e mais diversificado desta  forte metáfora do homem moderno, reflectora de uma crítica à sociedade ditatorial e seus excessos padronizantes. Além do mais, o simbolismo do zombie explora o medo irracional e intrínseco ao ser humano da perda da humanidade e da racionalidade, como também joga com a obsessão vida após morte. Com a sua primeira longa metragem, George Romero efectuou uma transposição moderna do mito do folclore haitiano associado à magia negra e vodu e, mais do que isto, deixou um legado cultural que faz do zombie um representação apocalíptica  das sociedades modernas.

Para se  entender a mensagem de A noite dos mortos-vivos e vê-lo como mais do que um simples filme de horror é importante entender o contexto histórico (de pleno conflito entre os estados Unidos da América e o Vietname). Não é por acaso que a história se situa na dita América profunda, que a causa da contaminação de zombies seja uma suposta radiação causada pela expansão espacial, e muito menos que o protagonista seja negro e  que consiga liderar um grupo de brancos. Estas características enfatizam na perfeição a aura de denúncia social e que desestabilizam os arquétipos sociais de um país que se auto-proclama como um líder mundial. Com uma narrativa simples e directa, mas inquietamente assertiva no seu intentos, George Romero constrói um encontro e posterior relação/confronto entre cinco pessoas que se encontram num velha casa rural abandonada, tendo  somente uma característica em comum: salvar as suas próprias vidas de um grupo de mortos-vivos (uma espécie de praga  que prolifera por todo o país).  É a partir desta premissa que o enredo enceta a crítica social e também uma demonstração do comportamento humano em situações extremas, em que as cinco personagens diferentes são reflexo de certos padrões sociais, lutando pela vida e também pela suas posições.

Aliada a esta forma de denúncia social, a homenagem ao género de horror da época de ouro de Hollywood é forjada através do preto-e-branco soturno da fotografia (que também pode ser interpretado como uma resposta desafiante ao standard do tecnicolor) e por uma sobriedade irrepreensível, que se destaca enquanto a narrativa se desenvolve, submersa por  uma aura de suspense quase agonizante. Este importante elemento da acção narrativa que consegue ser, em quase todos os momentos, mais perturbador do que a violência gráfica  (que chocou a plateia e a sociedade aquando a sua estreia nos cinemas). No entanto, o que torna a narrativa verdadeiramente assustadora é a sua crueza e sobriedade cénica,  denunciadora uma produção de baixo orçamento. O mal (os zombies) suscita uma espécie de medo ou angústia, desencadeados pela caracterização naturalmente grotesca, que torna estes seres verossímeis, ao contrário do que acontece das actuais e espectaculosas representações  do género.  De destacar que A noite dos mortos-vivos, sendo a primeira parte de cinco sequelas, é a mais distinta de todas, pela sua tensão e sobriedade, não dando azo a escapatória para qualquer momento mais descontraído ou cómico. Pelo contrário, o seu final devastador e quase messiânico devasta qualquer esperança de salvação da humanidade e intensifica a percepção que o homem é o causador/culpado desta devastação.

 

Crítica de Paulo Lopes


sobre o autor

Arte-Factos

A Arte-Factos é uma revista online fundada em Abril de 2010 por um grupo de jovens interessados em cultura. (Ver mais artigos)

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