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Num primeiro olhar, Bom Dia é um filme leve, que relata o dia-a-dia de cinco núcleos familiares e as suas preocupações mundanas. Uma comédia com fart jokes em que a narrativa gira em torno de um grupo de miúdos de escola, que habitam um pequeno bairro de casas tradicionais japonesas nos arredores de Tóquio, em que finas portas separam as divisões e vizinhos, abrindo e fechando num ritmo alucinante.
As suas mães são donas-de-casa e o seu quotidiano é passado dentro destas paredes. Entre limpeza, culinária e a educação das crianças, os dilemas e a fofoca desenrolam os acontecimentos e não há um minuto de sossego. E é aqui nos deparamos com a primeira camada deste filme: no Japão pós-guerra, a constituição familiar assenta na clara separação de papéis. Os maridos saem pela manhã rumo à cidade nos seus fatos ocidentalizados e as mulheres ocupam-se do trabalho doméstico. A relação de inferioridade nota-se em três momentos-chave: ao pai cabe a voz maior na educação dos filhos, as mulheres sentem-se inseguras e desprotegidas face ao vendedor agressivo, os homens trajam de fato mas elas continuam a trajar os vestidos travados e as socas de madeira que limitam os movimentos. E depois há escola: o contraste entre a doce e compreensiva professora dos jovens alunos e o austero professor dos mais velhos.
Porém, não é este o único contraste que salta à vista. Há três mulheres que desafiam o status quo: a irmã mais nova que usa os seus saltos altos e elegantes sobretudos estilo Coco Chanel, a vizinha mal vista que foi dançarina exótica (e que não curte a vizinhança), e a irmã do explicador desempregado que vende automóveis e sustenta ambos. Percebemos aqui que o realizador capta o Japão no grande momento de redefinição.
A ocidentalização do país nesta época é um tema recorrente da filmografia de Ozu e testemunhamos em pequenos apontamentos: a Vogue, os posters de cinema, os novos apartamentos encostado ao bairro tradicional. Mas é na televisão que o grande choque se dá. Os mais novos querem muito um televisor em casa mas os pais acreditam que o pequeno aparelho apenas estupidifica. Um voto de silêncio dos dois irmãos que reforça a sua proximidade, uma verdadeira luta de classes entre a minoria e o poder instituído, conduz ao momento mais apoteótico do filme.
Esteticamente, tudo é delicioso. Os tons pastel e a decoração que nos faz viajar até à loja Muji mais próxima, conseguimos perceber onde o génio de Wes Anderson parece encontrar inspiração. A mestria de Ozu faz-nos viajar para uma época nostálgica, em que a inocência estava presentes a desaparecer.
Filme exibido no Close Up – Observatório de Cinema de Famalicão 2016