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Star Wars: The Force Awakens
Título Português: Star Wars: O Despertar da Força | Ano: 2015 | Duração: 135m | Género: Acção, Comédia, Fantasia, Sci-fi
País: EUA | Realizador: J. J. Abrams | Elenco: Daisy Ridley, John Boyega, Oscar Isaac, Harrison Ford, Mark Hamill, Carrie Fisher, Adam Driver

Ingrata é a tarefa da pessoa que tenha de analisar Star Wars – the Force awakens e comunicar às massas a sua opinião. Em primeiro lugar, porque não interessa, as pessoas verão na mesma o filme; em segundo, porque é expor-se ao ridículo caso diga muito bem e à ira caso decida malhar num filme que toda a gente está à espera há anos. Em terceiro lugar, porque para o crítico, neste caso eu, se torna complicado lidar com algo que faz parte do seu património emocional.

Star Wars, mais do que qualquer saga cinematográfica, presta-se mais à nossa memória e à nossa emoção do que à análise. Vendo objectivamente, o único verdadeiro grande filme das seis obras passadas é The empire strikes back: compacto, com a densidade dramática certa, divertido e animado como tudo. Mas o fã não consegue lidar com essa verdade, e por mais que os restantes dois filmes da trilogia original não sejam maus, na nossa mente serão sempre algo de ampliado. Muitos vimo-los quando éramos crianças ou estávamos pelo menos em idade de ainda acreditarmos que tudo na vida era possível, que o sonho é, mesmo, uma constante da vida e livres das ironias pós-modernas que abundam na cultura moderna.

Ver Star Wars, voltar a Star Wars, será sempre regressar um local muito mais simples da nossa cinefilia, e da nossa vida, a um local de ainda alguma inocência e contactar com uma facilidade em nos alegrarmos que nos vai parecendo cada vez mais distante com a idade. Isto foi o maior erro das prequelas de George Lucas, a incapacidade de provocar tal reacção; e é precisamente o que JJ Abrams, sem arriscar mas com algum brilhantismo recupera no episódio VII destas aventuras galácticas.

Abrams não é novato nestas histórias. Coube-lhe a tarefa de modernizar o artrítico cadáver de Star Trek e conseguiu-o, com moderado sucesso e alterando significativamente a criatura de Gene Rodenberry. Em The force awakens, o wunderkind de Hollywood não ousa repetir a gracinha. O lema da sua realização é “Não mexas na fruta” e apesar de novos personagens, novos cenários, novas naves e novos mundos, o esqueleto do filme é completamente familiar. É notório que o realizador tem uma admiração reverencial pela trilogia original e acima de tudo, deve ter ficado bem escaldado como espectador da experiência das prequelas. Entra neste filme com o objectivo bem simples de não estragar e consegue-o, mas à custa da originalidade. Noutros filmes, isso seria um grande problema; aqui, não me parece que o seja, porque sinceramente, muito pouca gente quer novidade neste filme. A intenção é fazer reviver a ideia idílica que se tem de Star Wars, e Abrams está cá para isso.

A intriga gira em redor da busca por alguém que não divulgarei e os novos personagens tomam lugar de imediato: Poe Dameron é um fabuloso piloto da Resistência, o tipo mais cool da galáxia; Finn é um stormtrooper que não tem alma de assassino e procura o seu caminho para algo mais do que a mediocridade; Rey vive no deserto de Jakkuh a escafarunchar naves para vender peças. Kylo Ren veste de negro, usa a Força para o Mal e persegue um personagem que se revela fulcral para o equilíbrio da Força. Soa-vos familiar?

Apesar da familiaridade, há espaço para pequenas alterações interessantes. O protagonismo dado a uma mulher e a um negro num filme comercial desta dimensão deve ser algo de novo. E se no papel parece uma cedência ao politicamente correcto, rapidamente se percebe que John Boyega e Daisy Ridley estão mais do que bem escolhidos. Ambos trazem uma energia juvenil bem-vinda, um sentido preciso de, precisamente, sentido e no caso de Ridley, a inocência que cai bem no clássico arquétipo do herói com uma missão onde os filmes de Star Wars sempre assentam.

Se o Dameron de Oscar Isaac é apenas e só cool (aliás, cool cool cool), já Kylo Ren torna-se rapidamente no personagem mais interessante de todo o filme, um vilão complexo, com conflito e o total oposto de Darth Vader como pináculo de controlo, por motivos que se tornam óbvios no desenrolar do filme. Se todos, à excepção de Dameron, têm arcos narrativos bem definidos ao longo do filme, fica claro que Ren será aquele cuja história será o fio condutor desta nova saga, e Adam Driver, apesar de os restantes novos actores estarem bastante bem, tem todo o potencial para se tornar na grande revelação desta trilogia. Tal não se deve apenas à sua excelente performance, mas acima de tudo por ser o elemento mais imprevisível presente, a instabilidade que este modelo estanque precisa para atrair o espectador. A petulância adolescente, a instabilidade emocional e a maneira como elas se reflectem na sua presença são uma novidade. De facto, o que mais encanta nesta nova abordagem é a maneira como faz regressar pessoas à franchise, personagens com a qual o espectador se importa e que segue e com quem quer passar tempo, com quem se diverte. Não há dramas profundos, nem existencialismos vários, mas existem arquétipos genuínos e com quem nos podemos identificar. A meu ver, é a grande vitória de Abrams.

A nostalgia está na presença de alguns personagens da trilogia original (incluindo alguns cameos), com maior ou menor destaque, que são introduzidas em cena quase com passadeira vermelha. É neste quadro familiar que os novos elementos entram na consciência do público. Convivem sem problema e não existe choque. Os problemas do filme estão para lá da nostalgia e precisamente no que trazem de novo. A First Order, herdeira do Império, nunca é apresentada como mais do que uma organização vilanesca terrível sem objectivos claros que não sejam serem maus e destruir, e alguma intrigas políticas aludidas nem se percebem bem porque o filme está tão ocupado em ser uma montanha-russa de aventura que não perde tempo no desenvolvimento do pano de fundo desta trilogia. As facções existem como as encontramos e pouco mais, no que me parece ser uma oportunidade desperdiçada. A presença de um general, interpretado por Domhall Gleeson, é apenas desprezo a vociferar ódio, e nada mais. Embora vejamos a presença de uma figura que parece puxar todos os cordelinhos, e essa figura seja, de facto, poderosa, esta First Order desperta pouco interesse.

No entanto, estas interrogações surgem já depois de termos abandonado a sala de cinema. Porque nas duas horas e vinte que dura o filme, temos aquilo que aprendemos a amar em Star Wars: as batalhas espaciais (onde Abrams, apesar do CGI, respeita os ritmos e velocidades do original, numa reverência quase excessiva), os combates com sabres laser, os maus pressentimentos, a emoção que surge apenas numa bolha que não se expande, a ideia do percurso do herói clássico, as referências místicas à Força e os pequenos elementos que deliciam, como o novo droide BB-8, que promete ser a prenda mais oferecida deste Natal. No entanto, há pouca análise a fazer, porque, como referi no início, este não é um filme de análise. Quando estreou, em 1977, Star Wars teve uma recepção crítica pobre, mas foi ganhando popularidade porque era o filme escapista necessário, numa América que saíra dois anos antes do pântano do Vietname e vivia no pós-Watergate. O filme surgiu como escape, como duas horas no escuro de uma sala, longe da realidade. Num mundo onde o aquecimento global é uma ameaça real e não fantasma, onde o ISIS paira sobre as grandes cidades do mundo, onde a crise económica nos deixa a balançar na incerteza e onde tudo volta a ser incerto, a criação de George Lucas regressa para nos devolver a infantil capacidade do sonho ou simplesmente, o alívio de uma mente preocupada. Atesto-o: numa fase bem pouco positiva da minha vida, consegui distrair-me durantes quase duas horas e meia. É arte? Não. Mas rir não é filosofia, e no entanto não deixa de ser necessário. Talvez seja o melhor que se pode dizer sobre este The force awakens: a análise é terrena, ao alívio da alma está para lá dos planetas.


sobre o autor

Bruno Ricardo

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