Entrada estranha por aqui? Nem por isso. Naturalíssimo falar de ABBA em qualquer sítio. Podemos até especificar e dividir os mais alternativos dos públicos, do hipster ao da pesada, do punk ao vanguardista e é seguro que todos tenham em comum uma infância com os ABBA bem presentes e a capacidade de cantarolar, admitamos, umas quantas das suas canções clássicas. Mais transversais que muito artista aclamado. E muitos mais curiosos irão ouvir este novo “Voyage” que aqueles que o admitirão.

Percebe-se a dimensão do acontecimento e da notícia que nos chegava de todos os lados. O mundo até para: os ABBA a voltar com música nova! Justifica-se a curiosidade e até muita antecipação e hype. Mas são os ABBA. Lendário quarteto Sueco que apaixona imensos fãs pelo mundo fora, que cantaram e bateram palmas no cinema para cada adaptação cinematográfica da obra, que não dispensam a ideia de aumentar o volume quando os têm a acompanhar nas lides da casa, que canta o refrão de todos os clássicos até ao contrário. Mas se calhar é difícil encontrar alguém que conheça um dos seus discos na íntegra. Bem mais fácil será encontrar qualquer um, do coleccionador nato ao comprador casual, que tenha o “ABBA Gold” na colecção. É o seu estatuto. Das bandas mais presentes mas também com todo um legado de singles. Podia fazer diminuir o interesse em “Voyage,” mas os quarenta anos de “espera” têm aqui o seu peso e, fosse esta uma proposta envelhecida e descartável, acabaria por ter mais atenção e interesse que o “Voulez-vouz,” o “Super Trouper” ou o “Arrival.” Queremos saber como estão estes ABBA em 2021. Tudo familiar da forma mais surpreendente: nem dava para soar mais a ABBA do que isto!

Introduzido pela cinemática “I Still Have Faith in You” bem à Disney e seguida pela surpresa folclórica que é “When You Danced with Me,” vários tributos a si mesmos desfilam ao longo deste “Voyage.” Desde o verdadeiro throwback ao disco de “Don’t Shut Me Down,” à irmã mais nova de “I Have a Dream” que é “Little Things,” à mais Waterloo-esca “Just a Notion” ou a uma “Keep an Eye on Dan” a lembrar “SOS” – esse clássico que podemos ousar aqui e afirmar que é a sua melhor canção. E mais uns quantos temas menos memoráveis, também faz parte. É um disco dos ABBA, afinal. Surpreendemo-nos com o quanto as vozes de Agnetha e Anni-Frid não envelheceram, especialmente quando cantam juntas e até nos regozijamos no quão agradável foi a experiência. Até nem tem aqui mais um hit para juntar aos clássicos – apesar que “When You Danced with Me” se calhar até devia – e estão todos fartos de saber que vão voltar ao “Gold,” mas não há dedos de repreensão a apontar a “Voyage.” Nem aos ABBA, que são como uns tios que temos no estrangeiro, que aparecem de vez em quando e que até podem tornar-se um pouco embaraçosos com toda a sua berrante folia e foleirice. Mas gostamos deles.