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O mês de Setembro, pela antena da emissora nacional RTP2, será dedicado à filmografia de um dos maiores do cinema: Andrei Tarkovsky. A selecção de cinco filmes (de apenas sete filmes comerciais editados) será transmitida nas sextas-feiras, com um depoimento prévio da actriz Maria Leite. Tarkosvky é, invariavelmente, uma das maiores referências do cinema de autor: o russo é considerado sempre que se menciona o cinema europeu e toda a sua linhagem. Descansa, confortavelmente, ao lado de outros como Bergman, Antonioni, Rossellini, entre outros.
I don’t know why people expect art to make sense. They accept the fact that life doesn’t make sense. – David Lynch
O trajecto delineado pela RTP 2 começa com Andrei Rublev (1966), ainda um trabalho a preto e branco, que trata a vida do pintor religioso russo na Rússia do séc. XV. O filme está dividido em oito capítulos, cada um correspondente a um dado período temporal na vida do artista, e ao longo das suas três horas, notamos traços predominantes do cinema tarkovskiano: o trato delicado do tempo, a importância da fé e da arte, os momentos visuais captados e perpetuados como algo divino. Num dos capítulos finais, a construção do sino, temos eternizado um dos mais belos momentos do seu cinema: o devastador acto de fé.
Segue-se Solaris (1972), publicitado como um filme de ficção científica, e tido como uma espécie de resposta, ou complemento, ao trabalho de Kubrick em 2001: Odisseia no Espaço (1968). Em órbita no espaço, uma estação espacial deixou de responder aos contactos terrestres, e o cientista Kelvin é escolhido para fazer a viagem e averiguar as causas do silêncio. Em Terra, deixa o seu pai e a familiaridade da sua casa, onde, nos primeiros minutos, somos regalados com belíssimas cenas da vegetação e natureza envolvente (e, mais uma vez, surge o cavalo como símbolo de força e vitalidade, como em Andrei Rublev); já no espaço, começa a desenvolver-se uma trama críptica, embora extremamente íntima e invasiva, com o reaparecimento da falecida esposa de Kelvin. Não será tanto um fantasma como uma irreal projecção por parte do planeta Solaris, responsável pela loucura dos restantes cientistas da estação espacial. A ficção científica é apenas uma fachada: na verdade, Solaris é uma cuidada e intensa meditação sobre o amor, a solidão e a perda. Condição humana, portanto.
“The kind of cinema more interested in posing questions than in answering them — the cinema of Stroheim, Preminger, Rossellini, Cassavetes, Rivette, and Kieslowski, among others — is always bound to encounter resistance from critics and others who go to movies in search of certainties, and who often settle for half-truths or outright lies as a consequence. To interrogate the world is to inaugurate a search that continues after the movie’s over, implying a lack of closure that most commercial movies shun like the plague.” – Jonathan Rosenbaum
O terceiro filme é Mirror (1975). Nesta proposta, Tarkovsky permite que o vejamos de uma forma semi-autobiográfica, através das reflexões de um moribundo poeta sobre a sua própria vida. O filme toma-se como uma espécie de stream of consciousness, em permanente balanço entre o real e o onírico, traçando tangentes com a real vida do realizador russo – veja-se como excertos de poesia escrita pelo pai do cineasta aparecem no filme, lidos pelo seu próprio autor. Mirror era, de facto, um desejo antigo de Tarkosvky, que remonta ao período de gravação de Andrei Rublev. Um essencial na sua filmografia.
A penúltima sugestão é Stalker (1979), que por muitos é considerado o melhor ponto de partida para a sua arte. De volta a um mundo ficcional, a narrativa revolve numa expedição a um sítio misterioso, a zona, que tem o poder de realizar os mais fortes desejos do indivíduo; depois, o mês termina com Offret (1986), de produção sueca, no despontar da terceira guerra mundial.
Posto isto, temos em mãos uma óptima proposta pela parte da emissora nacional. O realizador russo é tido como uma incontornável referência para os amantes do cinema e um óptimo tutor para os que estão em vias de o ser; por ele guiados, entramos em viagens contemplativas e filosóficas, mesmo que, por vezes, sejam demasiado lentas, ou, até, abstractas, ou desconexas. Há óptimos recursos para mais se saber sobre o autor espalhados por essa internet fora; além disso, o russo escreveu um livro, Sculpting in Time, sobre a sua visão do cinema e da arte em geral. É imperdível!
PROGRAMAÇÃO RTP2:
2 de Setembro – Andrei Rublev
9 de Setembro – Solaris
16 de Setembro – O Espelho
24 de Setembro – Stalker
30 de Setembro – O Sacrifício
Interesso-me por muitas coisas. Estudo matemática, faço rádio, leio e vou escrevendo sobre fascínios. E assim o tempo passa. (Ver mais artigos)