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De 15 a 20 de Outubro, o Family Film Project – Festival Internacional de Cinema de Arquivo, Memória e Etnografia – está de regresso ao Porto para a 7.ª edição. O festival, organizado pelo Balleteatro, leva, ao Passos Manuel, Maus Hábitos e Coliseu do Porto Ageas, um programa variado que inclui sessões competitivas, masterclasses, eventos performativos e vídeo-instalações.
Com uma obra visual versada sobre a relação entre o público e o privado, entre a memória colectiva e a memória individual, Daniel Blaufuks é o artista convidado desta edição e vai apresentar, no Passos Manuel, no último fim-de-semana do festival, uma selecção de quatro filmes experimentais.
A 19 de Outubro, às 21:30, é exibido Carpe Diem (2010), filme rodado no Palácio do Marquês de Pombal, em Lisboa, que hoje alberga o espaço expositivo Carpe Diem, criado pelo curador Paulo Reis. A obra, filmada em película super 8, entrecruza os sons actuais do palácio (passos dos visitantes, da equipa, pássaros, aviões, entre outros elementos) com as composições para piano de Luís de Freitas Branco, que viveu e faleceu no local. Na sua apresentação original, no próprio espaço do Carpe Diem, os registos gravados juntavam-se ainda aos ruídos em curso naquele próprio momento, criando uma certa confusão sonora entre o gravado e o real, entre o passado e o presente.
Logo depois, é apresentado Sob Céus Estranhos (2002), um documentário que tem como cenário Lisboa, durante a Segunda Guerra Mundial, quando a cidade servia de corredor de passagem para os refugiados vindos dos territórios ocupados por Hitler com destino à América. O filme relata duas histórias paralelas sobre exílio e integração. Através de uma memória narrada e fotografias, é contada a saga de uma família judia alemã que decidiu ficar em Portugal. A história maior e mais sociológica, sobre os outros que usaram Lisboa como rota de fuga, é relatada igualmente através de filmes de época e as memorias escritas de alguns dos intelectuais mais importantes da altura, incluindo Heinrich Mann e Alfred Döblin. Este filme, apresentado anteriormente no Lincoln Center em Nova Iorque, evoca um tempo desesperado e intensamente romântico, de exílio, de falta de esperança e, em última instância, de liberdade.
No dia seguinte, sábado, 20 de Outubro, à mesma hora, são exibidos The Absence (2009) e Como se / As If (2014). O primeiro inspira-se em La Disparition, de Georges Perec, um romance escrito sem utilizar a letra “E”, para uma remontagem do clássico À Bout de Souffle de Jean-Luc Godard, na qual todos os planos com a personagem principal, o papel de Jean-Paul Belmondo, desapareceram. O que resta nesta ausência é a nossa memória cinematográfica que, instintivamente, tenta preencher este vazio, à volta do qual tudo parece girar.
Como se / As If é um vídeo que integrou a exposição de Daniel Blaufuks, All the Memory of the World, Part One, e que surge agora como objecto independente em contexto de sala de cinema. É um filme na cidade Checa de Terezín (Theresienstadt) concebido, desde o início, para a grande tela e foi editado a partir de diferentes fontes, construindo, assim, uma estrutura narrativa e cronológica específica, que intercala essas camadas alternativas. Estas são feitas de verdade e ficção, do chamado documental e do falso histórico, do drama romantizado e dos filmes de actualidades. O trabalho consiste em imagens gravadas em 2014 na própria cidade, novamente chamada Terezín, muito depois do seu breve período como Theresienstadt, durante a guerra. Estas imagens são também a maior parte de Come Se / As If e consistem, principalmente, em planos de rua de grande angular, fachadas de casas e portas de edifícios fechadas. Aí também se incluem pontos de vista de meninas em banhos de sol, adolescentes entediados, crianças a brincar, idosos em passagem, carros ruidosos e barulhentos e homens que compram cerveja. Na verdade, tudo o que compõe a vida de uma cidade normal e é reflectido pelas imagens da segunda maior fonte, ou camada, do falso documentário Theresienstadt feito pelos alemães em 1944, que pretendia mostrar exacctamente o quão “normal” era o campo de concentração da cidade-gueto. Esse filme exibe idosos em passagem, crianças a brincar, jovens a praticar desporto e homens a jogar xadrez. Algumas das imagens dialogam directamente com os seus pares anteriores, pois foram filmadas propositadamente nos mesmos locais.
Daniel Blaufuks tem trabalhado na relação entre a fotografia e a literatura através de obras como My Tangier com o escritor Paul Bowles. Mais recentemente, Collected Short Stories apresentou vários dípticos fotográficos numa espécie de “prosa de instantâneos”, um discurso baseado em fragmentos visuais que insinuam histórias privadas a caminho de se tornarem públicas. A relação entre o público e o privado, a memória individual e a memória colectiva tem sido, aliás, uma das constantes interrogações no seu trabalho. Utiliza principalmente a fotografia e o vídeo, apresentando o resultado através de livros, instalações e filmes. Algumas das suas exposições foram apresentadas no Centro de Arte Moderna, Fundação Calouste Gulbenkian (Lisboa), Palazzo delle Papesse (Siena), LisboaPhoto, Centro Cultural de Belém (Lisboa), Elga Wimmer Gallery (New York) e Photoespaña (Madrid), onde o seu livro Sob Céus Estranhos recebeu o prémio de melhor edição internacional do ano de 2007. Nesse ano, foi também galardoado com o prémio BES Photo. Em 2011, expôs no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro e, em 2014, no Museu Nacional de Arte Contemporânea em Lisboa. Em 2017, ganhou o Prémio AICA-MC Artes Visuais 2016, atribuído pelas exposições Léxico, realizada na Bienal de Vila Franca de Xira, e Tentativa de Esgotamento, patente na Galeria Vera Cortês, em Lisboa.
A Arte-Factos é uma revista online fundada em Abril de 2010 por um grupo de jovens interessados em cultura. (Ver mais artigos)