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Desde a nossa chegada ao Hard Club, no dia anterior, que sentíramos no ar uma atmosfera diferente. Motivada pelas dezenas de camisolas alusivas aos Neurosis, a ideia pairava cada vez mais insistentemente. “Será que vai mesmo acontecer?”.
Contudo, ainda havia muita música para desfrutar até ao final do dia. Dia esse que começou com o post-rock bem musculado dos Tiny Fingers, que sem tempo a perder destilaram riffs atrás de riffs, acompanhados por teclados bem preponderantes que fizeram o headbang do público chegar bem cedo. A toada manteve-se, logo de seguida, na sala 2 do Hard Club com a performance dos Tesa. O trio proveniente de Riga, na Letónia, tem uma abordagem interessante ao sludge, prova de que cada vez mais devemos olhar para outros mercados até no que à música diz respeito.
E se há país que tem exportado música interessantíssima, nos últimos anos, é a Bélgica. Aliados à família Church Of Ra, os The Black Heart Rebellion vieram ao Amplifest não apenas para tocar, mas também para fazer o público participar de um ritual ameaçador e misterioso. Num festival em que, regra geral, os músicos não têm muito a dizer e assumem uma postura low profile é refrescante assistir à performance cerimonial deste coletivo.
Não podemos deixar de referir a Amplitalk sobre os 30 anos de Neurosis. Scott Kelly e Steve von Till em conversa com José Carlos Santos em frente a um público tão reverenciador que vacilou no momento de interagir com os dois colossos da música alternativa de peso.
E já que falamos em rituais, os portugueses Névoa foram uma das belas surpresas do segundo dia de Amplifest. Autores do disco Re Un, lançado há um par de meses, subiram ao palco para ultrapassar largamente as expectativas que tínhamos sobre eles. A música composta por João Freire e Nuno Craveiro assenta as raízes black metal mas traz novos elementos à equação, surpreendendo sempre. Em palco, a força das dissonâncias e o vigor tribal ganha outra dimensão.
Um dos nomes mais aguardados desta edição, os Caspian, seguiram-se e mostraram que em 2016 ainda há quem consiga fintar os clichés do post-rock, um género que se encontra estagnado e só conhece saturação há cerca de uma década. Os americanos do estado do Massachusetts beneficiaram de um excelente som na sala principal do Hard Club e com composições dinâmicas e elegantes não defraudaram e deixaram o palco debaixo de uma chuva de aplausos.
O que se seguiu pode ser traduzido com o velho ditado “Não há fome que não dê em fartura”. Os Hope Drone vieram dos antípodas para apresentar uma proposta muito sui generis de black metal presente no seu disco de estreia, Cloak Of Ash. Em tour conjunta com os australianos, os Downfall Of Gaia também passaram pelo Amplifest e surpreendentemente, ou talvez não, foram um dos grupos mais aclamados deste segundo dia.
Para o pré-orgasmo, a Amplificasom reservou ainda dois concertos saídos do culto da Church Of Ra. Primeiro os Oathbreaker, que já por cá tinham passado, aproveitaram para estrear algumas malhas do próximo disco, Rheia. O quarteto, de quem se espera ser a nova next big thing, explora cada vez melhor a potente voz da vocalista, Caro Tanghe. O público presente mostrou-se atento e conhecedor dos temas novos mas foi com “No Rest For The Weary”, “As I Look Into The Abyss” e “The Abyss Looks Into Me” que o turbilhão emocional foi absoluto. Depois, CHVE, o projeto a solo de Colin H. Van Eeckhout, vocalista de Amenra, com a tarefa ingrata de tocar imediatamente antes dos Neurosis. Isto numa altura em que os corredores do Hard Club acolhiam centenas de pessoas que tentavam garantir um lugar na fila da frente do concerto dos norte-americanos.
O momento mais esperado, por fim, torna-se realidade. Com um Hard Club completamente esgotado, os Neurosis, porventura a maior instituição da música alternativa de peso, sobem a um palco português.
Há cerca de 15 anos atrás, quando conhecemos os Neurosis, este momento era absolutamente impensável. O quinteto, farto de longas temporadas na estrada, tinha tornado os seus concertos esporádicos, selecionando apenas alguns países de forma estratégica para tocar.
Em Portugal, principalmente no Porto, a divulgação cultural estava atrofiada e aquilo a que se assistia era a um afunilamento de ideias e ofertas. Há cerca de 9 anos atrás, quando conhecemos a Amplificasom, de certa forma, as coisas começaram a mudar.
Acompanhamos de perto o trabalho que estes rapazes iam desenvolvendo e o crescimento desta promotora de eventos do Porto. Acreditamos neles e sabíamos que, de alguma forma, a caminhada nos levaria até aqui. Estava escrito, desde o início, que a Amplificasom faria os Neurosis tocar em Portugal. No Porto, onde tudo é melhor.
Sobre o concerto serão sempre pálidas as palavras. Desde as primeiras notas sujas do baixo de Dave Edwardson em “Times Of Grace”, às complexas dinâmicas de “Lost”, ao peso esmagador de “Locust Star”, passando pelo groove irresistível de “Takeahnase” e até ao final colossal de “Stones From The Sky”, o que se assistiu foi uma performance de uma intensidade sísmica. Essa intensidade vem da honestidade com que Scott, Steve, Dave, Jason e Noah fazem a sua música. Uma honestidade sem igual. Os Neurosis não são ficção, são documentário, realidade pura.
No final, Dominick Fernow, aqui como Prurient, fez questão de dinamitar o que ainda restava do Hard Club e dos nossos ouvidos, com a sua ínfame prestação ao vivo.
Apesar de não ter terminado por aqui o Amplifest de 2016, há questões que se adensam. A Amplificasom começou como um blog de troca de ideias à volta deste universo musical, acabando por realizar o seu primeiro concerto ao trazer os Enablers ao Porto no final de 2006. Três anos depois, um ponto de viragem quando os Isis vêm a Lisboa e à Invicta. Em 2011 inicia-se uma nova era com a realização do primeiro Amplifest. Em 2016, com os Neurosis, o primeiro festival completamente esgotado.
Depois de nomes como Godflesh, Jesu, Godspeed You! Black Emperor, Amenra, Chelsea Wolfe, Cult Of Luna, Swans, Wovenhand, YOB, Converge, William Basinski e agora os Neurosis, falando apenas nas edições do Amplifest, há um sentimento de dever cumprido aliado a uma curiosidade que se encerra numa pergunta… “e agora?”. E agora, Amplificasom?