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Comecemos por confessar que, aqui pela redacção, atingimos pico-biffy-clyro em 2010 quando Only Revolutions (2009) fazia por nós o que nenhum álbum de Muse fazia desde Absolution. Com os lançamentos de 2013 e 2016, Opposites e Ellipses, respectivamente, surpreendemo-nos pela reacção morna que nos suscitou; como por razões de higiene nos escusamos de ouvir rádio, não temos o pulso corrente da base de fãs dos escoceses, nem sabíamos o que esperar da adesão do público nacional a este concerto.
Faltam dez minutos para as 21h quando olhamos em volta para medir entusiasmos. Alguns lugares vagos, facilidade em circular por entre o público em pé, pais com crianças, metaleiros em dia de folga e casais de namorados – tantos. A casa está composta, mas menos do que imaginávamos.
Despontam as 21h ao som de Sam Cooke. Os RattleSnakes, banda de Frank Carter, entram em palco acompanhados de “A Change Is Gonna Come”. Visual regrado, um rockabilly com orçamento que só deu para uma visita à Primark, que contrasta com o homem que lhes segue. Frank Carter tem tanto de estilo como de violência na voz. E começa o concerto de abertura.
Não sabemos quantas pessoas conheciam Frank Carter antes desta noite – há alguma partilha de fãs entre Gallows e Biffy Clyro? -, mas a prova de que entusiasmo e entrega fazem 75% de qualquer concerto é a conversão e baptismo dos presentes. E sim, há muito mérito em temas como “Snake Eyes”, “Juggernaut” e “Devil Inside Me” – afinal destroçar o Ed Sheeran e os Rollings Stones das tabelas do Reino Unido não é fácil – , mas nada paga um Frank Carter em ombros, no meio do público a destuir as cordas vocais, ou um guitarrista que não foi avisado que não estava numa banda de metal.
“A próxima canção é para aquela pessoa especial na vossa vida”, principia Frank, já no fim de um concerto de 35 minutos. E em únissono, com o efeito de comunhão que só mandar alguém para o caralho pode criar, a pulmões cheios, o Coliseu dos Recreios entoa “ I Hate You”, “and I wish you would die”.
Depois de um concerto com temas dedicados aos técnicos, à filha de Frank, aos Biffy Clyro, e ao público – que chegou irrepreensivelmente a horas -, agora é a vez de Lisboa mostrar apreço aos artistas enquantos estes se despedem.
Pausa para respirar.
Não vamos mentir, por esta altura atravessou-nos o temor de que os Biffy Clyro iam ser ofuscados pela banda de abertura. Quando a banda entra pontualmente em palco, estática, ao som de um coro de canto gregoriano que repetia ad nauseum, “joyfuly”, pensámos que estava tudo perdido.
E depois acontece.
Goste-se ou não do rumo que a banda escocesa tomou, uma verdade mantém-se inalterável: ao vivo não há muitas bandas que lhes toquem. “Wolves Of Winter” sai directamente de Ellipses para o palco para se tornar a música favorita de quem a ouve. A julgar pelo número de pessoas que já entoam os refrães, não podemos estar muito longe da verdade.
Ouvem-se “Living Is a Problem Because Everybody Dies” e a mais-pop-que-um-detergente-de-loiça, “Howl”, antes de Simon Neil se dirigir ao público com um “obrigado” e soltar um “Lisboa” com um sotaque perfeito. Apesar de parcos em palavras a jovialidade e postura divertida em palco fazem a ponte com o público que se vai galvanizando.
“Biblical” levanta todos os sentados no Coliseu. É o primeiro momento marcante da noite, especialmente para os casais que num repente brotam como cogumelos selvagens, lembrando aos restantes de nós que a seguir a isto o que nos espera é uma piza congelada do Continente e morrer sozinhos. Ainda assim, tudo muito bonito e amoroso.
“God & Satan” sucede a “Victory Over The Sun” e ficamos destroçados. Não é a esta a segunda melhor canção do melhor álbum da banda? Só nós é que temos os primeiros versos tatuados na memória? O que é que justifica esta não-reacção do público ? Supomos que seja expectável – até sinal de vitalidade – que, por esta altura, haja pelo menos três gerações de fãs de Biffy Clyro. A julgar pela euforia com que mais tarde foram recebidas “ Re-arrange” e “Machines”, e pela não inclusão de “The Captain” no alinhamento, assumimos que a maior fatia dos presentes foi recrutada de 2013 para a frente e que do passado sobrevivam ao vivo apenas os êxitos perenes.
E por falar nisso: ‘Esta é a “Bubbles”’, anuncia-se. Por esta altura a camisa sai de cena e Simon assume a sua forma final e digivolui para Cristo tatuado da guitarra eléctrica. O concerto engata a quinta e precepita-se em grande impeto por “Boooooom, Blast & Ruin”, “Friends and Enemies”, “Modern Magic Formula”e “ Black Chandelier”, com a letra na ponta da língua.
O alinhamento do dia não nos traz surpresas nesta digressão. Em compensação, o processo de tentativa e erro para perceber o que resulta dá-nos um ritmo de festa que sabe quando acalmar para não causar fastio. “Re-arrange”, dá-nos esse hiato quando começamos a precisar. Nas nossas notas, “Herex” está a seguir. Francamente, já nos tínhamos esquecido. Entre estes temas mais acústicos, que ainda incluiem “Medicine”, há sempre algumas baixas. “Glitter And Trauma” teria melhor sorte, cortesia da saída e reentrada em palco dos músicos ao som de qualquer coisa genéricamente techno.
Ainda bem que assim foi, porque a sequência que se segue inclui “Mountains”, “In The Name Of Wee Man”, “Flammable”, a sentir-se em casa, “That Golden Rule” e “Many Of Horror”. É um testemunho à criativade eclética dos Biffy Clyro que possam incluír singles atrás de singles e não causar saturação.
A banda despede-se do palco. Sabemos que há encore e por isso não nos preocupamos e agradecemos o tempo para recuperar o folgo. Devíamos, também, nestes momentos, agradecer aos técnicos de som e aos profetas responsáveis pelo Coliseu. Não sabemos o que está a acontecer áquela hora na MEO Arena – Deus queira que seja uma qualquer festa de natal corporativa para dar expiação a colaboradores e convencê-los de que são felizes para repetirem tudo mais um ano-, mas ainda bem que temos os Biffy Clyro aqui. Para uma banda que vive do peso que o baixo acrescenta ao som é preciso um espaço que lhes faça justiça. Obrigado, agora de volta ao concerto.
“Machines” é, sem reservas, o momento da noite. Explicável? Talvez, mas não por nós que fomos apanhados de surpresa. Só podemos garantir que fomos os únicos. Percebe-se pela emoção palpável a escolha deste tema dar o mote a um encore que preludia o fim da noite.
Não ouvimos a banda falar muito, mas, do que ouvimos, retivémos a vontade que já tinham de voltar a Portugal. Entre “Animal Style” e a avalanche que é “Stingin’ Belle” há direito a promessa: “ não vamos demorar tanto até à próxima vez.” Palmas e ovações. A banda lança-se num último momento de caos concertado e os presentes repetem a deixa antes do adeus: “WE ARE BIFFY – FUCKING – CLYRO!”.
Ficamos a pensar na frase enquanto os ânimos acalmam. Por esta altura, é díficil dizer quem são os Biffy Clyro. A banda está numa fase da carreira que, tal como a outros grupos antes deles, se ouvem vozes que os acusam de serem demasiado pop e comerciais. Faz parte. E acima de tudo, não interessa. Enquanto a banda souber quem é, pela nossa parte, só nos interessa saber que ao vivo fazem crentes de qualquer um.