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“The first time we came to this part of the world, we came here first and I said: next time, let’s make it the last place we go”. Não foi a primeira vez que ouvimos estas palavras de Dave J. Matthews, já no concerto no Coliseu do Porto, com Tim Reynolds em 2017, depois de uma afirmação semelhante, fomos apelidados de “caviar” do público europeu e esta cumplicidade entre a Dave Matthews Band e Portugal nasceu ali mesmo no palco da Altice Arena, há 12 anos atrás, outrora Pavilhão Atlântico, antes das poderosas marcas retirarem a identidade a uma das maiores salas de espectáculos portuguesas, num concerto que, por mais que vos tentemos explicar, não encontramos palavras, gravações ou testemunhos, capazes de fazer verdadeira justiça a toda a emoção que se viveu nessa noite, entre público e banda.
Felizmente, não seria essa a única visita da Dave Matthews Band ao nosso país e ao longo destes anos fomos presenteados com outros concertos, todos eles cheios também de momentos muito especiais. O mais fresco na nossa memória será possivelmente quando, em 2015, o público “obrigou” Carter Beauford a regressar à bateria para um reprise da “Grey Street” – um momento que, aparentemente, nem a banda esqueceu, já que foi a música escolhida para abrir o concerto do passado sábado. E se parece que nos estamos a repetir, ao recuperarmos sempre as mesmas memórias, de cada vez que falamos de um concerto da Dave Matthews Band por cá, não é por saudosismo que o fazemos, é porque elas são de facto demasiado importantes e inestimáveis, e ajudam a explicar essa sensação de insatisfação e dúvida que acompanhou muitos, sobretudo aqueles que estiveram lá desde o dia zero, à saída da Altice Arena neste último concerto, naquilo que mais tarde seria descrito como “um bom concerto da Dave Matthews Band, mas não um grande concerto da Dave Matthews Band em Portugal”.
O que é que falhou desta vez afinal, se é que algo verdadeiramente falhou? Com o coração numa mão e a cabeça noutra, tiramos medidas à noite de sábado, tentando fazer com que emoção e razão não se atropelem e nos atraiçoem a conclusão final.
Comecemos então pela duração: desta vez não aconteceu uma maratona épica de quase 4 horas com vários encores – a banda ofereceu-nos duas horas e tal de concerto (até parece pouco, não é?) com apenas um encore, como aconteceu aliás em todas as outras cidades desta digressão europeia. Quer isto dizer que já não somos assim tão especiais? Não, mas a verdade é que desta vez não fomos assim tão “caviar” e não fizemos a Altice Arena tremer como o mesmo entusiasmo de outras eras, porque acreditem que se o tivéssemos feito, não arredando pé, era bem possível que a banda regressasse a palco, até mesmo Carter Beauford, que mais tarde soubemos encontrar-se doente nesse dia, talvez tivesse feito das tripas coração e voltado para dar tudo, uma última vez.
Carter Beauford, esse colosso da bateria, maestro e coração da Dave Matthews Band, que até num dia mau e aos seus 61 anos, escondidos atrás do sorriso pastilha elástica mais franco que conhecemos, consegue ser melhor que a maior parte de todos os grandes bateristas que neste momento nos vêm à cabeça. No passado sábado não nos destruiu com um dos seus solos monumentais, como já o fez em outros concertos, embora aquela entrada da “Gravedigger” nos tenha arrepiado os pêlos da nuca, nem ganhou batalhas contra o saxofone de Jeff Coffin, mas continua a ser a estrela à volta do qual todos os planetas da banda giram. Todos sabemos que é tão verdade dizer que não existe Dave Matthews Band sem Dave Matthews, como também o é dizer que não existe Dave Matthews Band sem Carter Beauford. E é inevitável pensarmos até quando irá o maestro conseguir assegurar os comandos da banda, porque os anos passam, até por nós que, ainda a meio do concerto, já sentíamos as pernas e as costas a gritar por descanso. Tentem então imaginar-se atrás de uma bateria, uns dez minutos apenas, a fazer o que Carter Beauford faz durante um concerto inteiro – aposto que 2 horas agora já não vos parecem assim tão pouco, certo?
Não queremos tornar este texto amargo, apenas queremos genuinamente perceber porque é que desta vez não saímos a flutuar da Altice Arena como em outras vezes e sabemos agora que os únicos culpados fomos nós. Nós e as nossas expectativas exacerbadas em relação à banda que, não assim há tanto tempo atrás, nem sequer sonhávamos com a hipótese de um dia ver ao vivo, muito menos por cá. A banda que cada vez que pisa os nossos palcos se desdobra em declarações de amor a Portugal. A banda que agora nos damos ao luxo de criticar porque em vez de uma “Funny the Way It Is” não tocou, por exemplo, uma “The Last Stop”, que há anos achamos que nos é devida, porque os fãs são assim, pessoas que se acham detentoras de direitos especiais e irreais.
Não nos tornemos, por favor, neste tipo de fãs e apreciemos a banda que mais uma vez nos deixou todo o seu amor em palco, até porque continuamos a ser um público capaz de momentos incríveis, como o respeito do silêncio que se fez na frágil “Here On Out”, com Dave Matthews, sozinho em palco, a ser mais uma vez esmagado pela indescritível beleza que as inúmeras luzes de telemóveis criaram por toda a sala.
E se sentiram que o texto estava a ficar amargo é também porque ainda não falámos de outros grandes momentos da noite de sábado. Quem de vocês teria tido a coragem de apostar que a “Stand Up” poderia vir a ser uma das melhores performances da noite? O responsável: Buddy Strong, o mais recente membro da família “dmbiana” veio injectar todo um novo groove à banda, não só com os seus teclados mas também com as suas interpretações carregadas de funk e o seu sorriso contagiante – nem era preciso a t-shirt para o óbvio: good vibes always!
Um pouco mais atrapalhado esteve o convidado da noite, Carlos Malta, mas é fácil perdoar-lhe os pequenos lapsos porque não deve ser nada simples cair de pára-quedas na cumplicidade que todos estes anos criaram na Dave Matthews Band, muito menos em músicas tão icónicas como “Dancing Nancies”, “Jimi Thing” e “Warehouse”. O brasileiro pareceu-nos genuinamente feliz em palco e as suas flautas trouxeram-nos muitas vezes Leroi Moore à memória.
“Sledgehammer”, cover de Peter Gabriel, foi o momento mais sacudido da noite e embora seja sempre algo estranho ver Dave Matthews de microfone em punho, imaginamos todo o potencial de dança que não terá ficado para sempre escondido atrás da sua guitarra. Mesmo com tanta gente e tanto talento em palco o nosso olhar acaba por inevitavelmente prender-se na sua figura carismática, embora se afaste muitas vezes do centro para que as atenções recaiam nos seus companheiros de banda. Esta humildade só nos faz admirá-lo ainda mais. E depois há aquela voz irrepreensível, como sempre. A sua interpretação visceral de “All Along the Watchtower” é tão poderosa que mais valia que Bob Dylan lhe cedesse os direitos desse clássico da música popular americana.
Sempre discreto mas sempre basilar esteve o baixo tenso de Stefan Lessard, que brilhou na habitual intro para “All Along the Watchtower”. Jeff Coffin e Rashawn Ross sublimes nos metais, e Tim Reynolds desta vez algo mais contido na guitarra eléctrica, o que até preferimos, completaram o resto do quadro dessa banda que nos fez verdadeiramente compreender o êxtase que jams com mais de 15 minutos podem provocar. A banda que, ainda hoje, e já bem longe dos nossos tenros 23 anos ainda nos faz olhar para o céu, incrédulos com a beleza disto de estarmos vivos: “what’s the use in worrying, what’s the use in hurrying”. A banda que, nesta noite, mais uma vez ali reuniu as amizades que tanto ajudou a criar durante todos estes anos, histórias de vida, amargas e doces, que hoje já são também um pouco de todos nós. A banda que esperamos poder ver ainda muitas mais vezes, embora a razão nos diga que nada dura para sempre, “because life is short but sweet for certain”. Da nossa parte podemos prometer que: enquanto por aí estiverem com música e amor para nos dar, nós estaremos sempre cá.