Reportagem


Glassjaw + Ash is a Robot + Algumacena

A meio de outubro ainda vamos falar disto

LAV - Lisboa Ao Vivo

23/06/2019


Ó tempo volta para trás, traz-me tudo o que eu perdi nos meus anos de adolescência. Falhando isso, traz-me Glassjaw em 2019 que um tipo já fica satisfeito.

Não há que enganar, o apelo do concerto da banda de Long Island no LAV é um misto da nostalgia da nossa adolescência e da vontade de estar presente para a estreia absoluta em Portugal dos Glassjaw. Nada contra os que ali estariam para ouvir temas do mais recente Material Control, mas questão rápida: quem são vocês?

O certame começou a rasgar e sem cerimónias com os Algumacena. O nome é novo, mas as caras já são veteranas da cena. Alex D’Alva Teixeira em modo post-hardcore e Ricardo Martins em modo Lobster.

A t-shirt dos Dillinger Escape Plan não deixa enganar, fora a propensão para rimar verbos no infinitivo, não há muito que nos faça lembrar D’Alva. Mais distorção, mais garganta, mais bateria e sobretudo agressividade que não convida a muitos malabarismos musicais. A cristalização da atitude “in your face” ficou perfeitamente esplanada quando se cantou com a veia no pescoço as palavras de ordem “racistas, fascistas, não passarão”.

Já os Ash is a Robot começaram o concerto a todo o gás para perderem o ímpeto logo após a primeira canção quando a peça que prende a alça do baixo se soltou e teve que se recorrer a metros de fita adesiva para a prender. Ainda foram alguns minutos que o vocalista tentou salvar, mas sentiu-se um constrangimento palpável. É quase injusto mencioná-lo porque não haveria mais sobressaltos num concerto que de outra forma teria sido impecável. Os sadinos bebem da mesma fonte do metalcore que a maioria dos seus conterrâneos dignos de mencionar e ali, no palco do LAV, estavam perfeitamente em casa e se alguma vez acusaram a pressão ela não se notou. +1 para o timoneiro do microfone que faz parecer fácil agir como se se fosse dono do palco.

Finalmente, os Glassjaw.

Vamos confessar alguma apreensão, ouvimos alguns relatos do concerto na noite anterior, no Porto, e parece que o som não estaria nas melhores condições. Lisboa, teve mais sorte, o som estava bom – não excepcional, mas bom – mas foram tantas vezes que o público juntou a sua voz à de Palumbo que quase seria irrelevante. Começaria com “Cut and Run” a fazer ecoar o verso “too mortal war” a decibéis não recomendáveis.

Palumbo trouxe o seu “A game” para Portugal e não podíamos ter ficado mais espantados. Anos a cantar num registo muito abaixo do que é a sua voz natural não fazem maravilhas pela voz de ninguém. O paralelo que mais depressa nos ocorre é o de Anthony Green (Saosin e Circa Survive), mas é fácil contrastar as duas vozes em tom falado. De resto, não lhe recomendamos o visual “cinco noites sem dormir” que ostentava, mas isso é de somenos.

O público agitava-se sem que a comoção alguma vez resultasse num moche digno desse nome, mas o investimento da plateia foi sempre de louvar. Teríamos ficado mais agradados com retribuições mais verbosas da parte da banda, que numa das poucas vezes que se dirigiu ao lado de fora do palco pergunta, “who has not seen us before?” Uma legião inteira levantou as mãos. “That’s right, we’ve never been here before.”

O concerto desenrolar-se-ia sempre a passo acelerado, com a devida interrupção para “Ape Dos Mil,” tema mais catchy e sui generis da discografia da banda, a dar-nos conta que entraríamos na segunda metade do espetáculo. Muito enfâse no último álbum, decisão legítima, mas que para uma turba que vê Glassjaw pela primeira vez pode ter parecido injusta, com investidas nostálgicas que não podiam faltar. “Siberian Kiss” pôs o ponto final na actuação porque não há realmente uma outra forma de acabar. Que catarse para além desta seria possível?

Esperemos que o regresso seja breve e que haja um público renovado. Não é que não houvesse alguma adolescência presente, mas não houve como ignorar, os trintões estavam em maioria.

Galeria


(Fotos por Hugo Rodrigues)

sobre o autor

Jorge De Almeida

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