Reportagem


Mastodon + Black Peaks

Se isto é o inferno então estamos no caminho certo

Sala Tejo / MEO Arena

21/06/2017


Se o primeiro dia do verão até deu tréguas ao calor abrasivo desta semana, os Mastodon, por sua vez, fizeram-nos a todos descer alguns degraus até ao inferno, na passada quarta-feira. Pelo final da noite, a Sala Tejo da MEO Arena parecia uma babilónia suada onde, por entre o atropelo de corpos transpirados e os muitos palavrões vociferados, o entusiasmo, ao que se tinha acabado de ali viver, estava estampado nos rostos esfuziantes à saída. Se isto é o inferno então estamos no caminho certo.

Ao seu sétimo álbum, o recente Emperor of Sand, que os trouxe de volta a Portugal em nova digressão, os Mastodon já não precisam de dar provas a ninguém, nem aos que rejeitaram os últimos discos. Querer que as bandas sigam sempre uma carreira exponencial, com cada novo álbum a suplantar o anterior é irrealista e até egoísta. Numa encruzilhada onde se opta por um desvio musical haverão sempre os que seguem e os que abandonam, mas o que realmente importa reter é o caminho que os Mastodon até aí abriram, na forma como ampliaram o espectro do público que ouve metal. Se não tivessem sido eles seriam outros? Provavelmente sim, mas interessa mesmo falar disso?

Aos que ficaram por casa porque Emperor of Sand não lhes encheu as medidas, cometeram um erro tremendo, é que ao vivo não se sentem aquelas arestas limadas que encontramos em disco. Ao vivo os Mastodon imprimem nestas novas músicas a crueza e energia de sempre, como ficou logo provado com “Sultan’s Curse” a abrir a noite prego a fundo. Concedemos apenas um momento meio desenquadrado à pop orelhuda de “Show Yourself”, que Anthony Fantano definiu hilariantemente como algo que soa a como se os Foo Fighters fizessem uma cover de Queens of the Stone Age. Superada essa, que até proporcionou um momento mais descontraído na tensão fervorosa que é cada música da banda de Atlanta, a setlist percorreu toda a discografia, recebendo as maiores ovações para as músicas retiradas dos aclamados Crack the Skye e Leviathan. “Oblivion” foi cantada em uníssono até fazer as gengivas sangrar. “Blood and Thunder”, no fecho do encore, rasgou a sala num moche desenfreado, de quem abandona o corpo e aproveita a última oportunidade para exorcizar todos os demónios.

Nota negativa para o som embrulhado da sala, que castigou sobretudo os vocais quase imperceptíveis a meio da plateia. Salvaram-se os solos prodigiosos e orgásmicos da guitarra de Hinds e a bateria musculada de Dailor que várias vezes deixaram o público em delírio. Um público a quem Troy Sanders disse querer poder agradecer a cada um individualmente se para isso tivesse tempo. Um público que há quem defenda ser o mais fiel, o do metal, aquele que para onde quer que olhemos batemos os olhos numa t-shirt de Mastodon ou de uma outra qualquer banda da pesada. Uma plateia onde poucos telemóveis se avistam e a música ainda se vive com intensidade e brutalidade genuínas.

Um concerto de Mastodon é a garantia de vermos muitas pernas no ar, muito air guitar, muita cerveja desperdiçada no chão e de regressar a casa com os ouvidos a zumbir até adormecer, completamente redimidos. Esperamos que por cá se repitam muitas mais noites assim.

Galeria


(Fotos por Hugo Rodrigues)

sobre o autor

Vera Brito

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