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Eis o derradeiro dia de NOS Alive 2018. Este último artigo sobre o festival servirá mais como artigo de opinião do que reportagem, aproveitando os últimos resquícios de sanidade mental que me restam para explicar objectivamente o que só pode ser apreciado subjectivamente.
Se quiserem ler sobre os dois dias anteriores, as hiperligações estão no fim da página.
Porque o busílis é: Eu adoro bolos. Não, esperem. Festivais. Eu adoro festivais. E mais vezes do que não parece que o meu trabalho é encontrar razões para não gostar duma experiência que para muitos é um luxo que não sai barato. Ser um merdas profissional que está lá para escrever uns artigos e que parece que existe para vos dizer: gostaram duma coisa que não foi boa. Mais, este ano parece que o tema é “não foi bom e a culpa é tua.”
Em entrevista à Arte Sonora, Álvaro Covões explica como acha que Portugal é um país de roque e que quem vai ao NOS Alive, vai para ouvir música (em oposição a festivais a que se vai pelo acampamento, por exemplo). Nós acreditamos que o NOS Alive continue a ser feito para estas pessoas, e, de forma geral, o cartaz evidencia-o. E graças a Deus por este festival que parece ser o único evento capaz de trazer consistentemente nomes grandes que interessam às pessoas da bolhinha melómana em que vivemos e que lêem estes artigos. Mas esta edição de 2018, custou. Custou porque pareceu vítima do seu próprio marketing. Em duas vertentes: por um lado, porque sofreu com um público demasiado interessado em Pearl Jam e que, apesar de já ter idade para ter juízo, ocupou as filas da frente para se prostrar perante o Eddie Vedder. Em segundo lugar, e este ponto é mais complicado de explicar, porque o NOS Alive é um festival demasiado trendy. Não o cartaz, mas o próprio evento. É um festival que cria FOMO, acrónimo de “fear of missing out”. O Rock in Rio sabia o poder deste fenómeno quando na sua primeira edição espalhou o slogan “Eu fui”. O NOS Alive chegou lá organicamente e agora concretizou-o com slogans bonitinhos para a geração instagram.
O caso mais aberrante que vimos envolveu duas moças que perderam demasiado tempo a escolher a indumentária a correr de copos na mão durante o concerto de Sound Bullet enquanto um vídeografo de gimble e Sony corria atrás delas e lhes dava indicações. Uma e outra vez para apanhar o momento perfeito.
É isto: NOS Alive 2018. B-roll para a tua vida.
Então que aconteceu aos concertos?
Rápido, que banda falta aqui: Pearl Jam, Soundgarden, Nirvana e …
Pôr Alice in Chains no mesmo dia que os conterrâneos de Seattle é uma escolha tão fácil que quase não justifica o ordenado de alguém. O que não foi fácil foi encarar um público que face aos temas mais metal como “Them Bones”, “We Die Young” e “Man in The Box” reagia como se estivesse a ouvir covers de bossa nova de Bon Jovi (não googlem). Duvall bem tentou puxar pelo público enquanto Jerry Cantrell assumia o lugar de pendura, mas nunca teve a reacção que merecia. Foi um esforço de insistência e perseverança só para conquistar os poucos que se encontravam junto à grade. Valeu-lhes “Nutshell” e “Rooster” para integrar as vozes do público no espectáculo. Um concerto que merecia um retorno do empenho que se via em palco.
Já os The Last Internationale anteriormente haviam passado pelo mesmo, mas o pandering extra teve melhores resultados. Como dissémos na nossa reportagem, compensa ser filho da terra. Só os Franz Ferdinand tiveram o gusto na sua actuação para dar a volta ao público e levarem com eles a medalha do segundo lugar do festival.
E depois entrou Jack White.
Nós acreditamos que a metade masculina dos White Stripes é um dos músicos mais criativos e virtuosos que anda debaixo do sol. Não estamos exactamente deslumbrados com o seu projecto a solo, mas entre o duo que fazia com Meg White, os Raconteurs e os Dead Weather há temas para nos pormos a admirar durante dias. Aparentemente, estamos sozinhos.
Ver um dos melhores guitarristas do mundo ser ignorado sem cerimónias foi um dos momentos mais sofríveis por que já passámos em festivais. Até nos custa dizer o que não gostámos na performance -“Hotel Yorba” funcionava pelo rudimentarismo punk da original e não por ser o objecto que parodiava – porque seria bater no ceguinho. Pararam os fãs de Pearl Jam de ouvir música depois de 1998? Será assim tão difícil ficar surdo durante a “Seven Nation Army”? É que mesmo não conhecendo, é uma melodia que se apanha rápido. “Mas as pessoas até cantaram,” diz a voz na cabeça de um de vós que nos lê. Ao que respondemos, as pessoas cantam-na mais alto quando vão ver a bola. As pessoas cantam-na mais alto quando outra banda a toca. Sabemos isso porque nem duas horas depois os Pearl Jam tocaram o riff e nós presenciámos o fenómeno. Os The Cult devem estar todos contentes, já que não são os únicos a ter que passar pelo opróbrio de ouvir uma ovação maior a uma música sua tocada na mesma noite por uma banda diferente.
Resumo:
Mas, hey, pelo menos o prato forte da noite vai salvar tudo isto. O Eddie Vedder entrará em palco e tudo estará de novo bem com o mundo, certo?
Certo?
Alguém?
Há as mesmas hipótese de uma bola de neve no inferno de nós algum dia dizermos mal dum concerto de Pearl Jam. Quando os americanos são maus, são bons. Quando são bons são incríveis. Mas que alinhamento tão estranho. “Betterman” praticamente a abrir, “Lukin” a seguir a “Black”, “Yellow Ledbetter” esquecida, “Last Kiss” esquecida, “Just Breathe” esquecida. No geral, parecia um bocado escolhido ao calhas só porque não há hipótese de falhar. Pelo menos houve direito a “Jeremy,” ocasião que devemos celebrar pela sua raridade. Também digno de nota, foi o regresso de Jack White a palco para um momento único que devolveu alguma justiça ao mundo. Gostaríamos de o ver envolvido em mais do que apenas uma “jam” glorificada ao som de “Keep On Rockin In The Free World”, mas agarramo-nos ao que podemos. Infelizmente, no fim desse interlúdio musical que é o fim da cover de Neil Young, vemos os Pearl Jam a voltarem-se para os seus instrumentos, apenas para serem informados que não haveria mais tempo. Suspeitamos que viria aí uma “Yellow Ledbetter.” Ainda bem que passámos os últimos cinco minutos a ouvir os mesmos três acordes ad nauseum.
Compreendemos, afinal de contas já passava do tempo. A propósito, enquanto tocava Pearl Jam, não acontecia mais nada em todo o NOS Alive, o que parece ter sido uma escolha deliberada da organização.
Nós queremos oferecer a seguinte sugestão: e que tal se “não”?
No mundo em que “Portugal é um país de roque,” também tem que ser o país em que, para alguém, bandas como At The Drive-In valham por si o preço de admissão. Ouvir um dos maiores nomes do post-hardcore tocar uns míseros 30 minutos não chega para tirar a barriga de misérias. E alguém ficou para ouvir os The Gift?
Não sabemos bem como sumariar esta edição. Por um lado, o cartaz foi dos mais fortes que vimos este ano por uma larga margem. Em ano de Rock In Rio este elogio é ainda maior. Por outro, sentimos que houve um ambiente tão morno que descaracterizou a experiência de ir a um festival.
Não tiramos prazer nenhum de um artigo moralizador; cada festivaleiro paga o seu bilhete e desfruta do concerto como lhe apraz. Se alguém quiser passar um NOS Alive na caça ao brinde e a jogar matraquilhos, é um direito que lhe assiste.
Mas a música vive de espectáculos ao vivo e estes são feitos a dois. Se uma das partes não colabora, é um espectáculo menos bom. Não há volta a dar. E isso é uma escolha – válida, até – mas que não compreendemos. Até Pearl Jam ficou aquém dos dois concertos que já deu no Passeio Marítimo de Algés. Ficámos assim tão mais velhos desde então?
Claro que o NOS Alive não será nunca um mau festival. É objectivamente bom e capaz de proporcionar momentos isolados a que atiraríamos todo o nosso dinheiro para repetir – todas as minhas lágrimas ficaram na “Black” -, mas queremos sempre mais de um festival que já é demasiado grande para falhar.
