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A quinta edição do Primavera Sound no Porto está a revelar-se uma das melhores, com concertos memoráveis, afluência de público nunca antes vista e uma transformação saudável do recinto em Torre de Babel. Não se sabe bem se vieram ao Porto e acabaram por comprar entradas para o festival ou o oposto, mas é patente e evidente a massa multicultural no Parque da Cidade.
Terá sido um dos dias mais procurados e com razão. Um claro Rei e uma evidente Rainha – Brian Wilson e PJ Harvey – deram uma lição de história e os príncipes da música contemporânea – Floating Points e Holly Herndon – lançaram uma antevisão do futuro. Mas já lá vamos, porque foi um alinhamento divino feito a muitas mãos.
O nosso dia começou com Cass McCombs, perto das 18h. Num acontecimento de música como este, em que a festa dura até às últimas horas da noite, ir ao concerto das 17h com White Haus revelou-se uma missão verdadeiramente impossível. Cass McCombs é recorrentemente comparado a Bob Dylan e a um jovem Roy Orbinson, sente o pulso da sua nação e relata estórias do coração do território. Foi com um tom de roadtrip pela paisagem de deserto que começou: “Big Wheel” soou maravilhosa como sempre. Passou por alguns dos seus clássicos, ofereceu-nos o “Opposite House” já retirado do novo álbum, e encerrou com “County Line” – na mesma linha com que começou. A beleza melancólica das suas composições encheu a vista, os ouvidos e o coração.
Pouco depois, a romaria seguiu para o palco ao lado para mostrar a sua devoção a Destroyer e a Dan Bejar, que é tido como um dos mais completos songwriters, pela forma poética e idiossincrática como se expressa. A sua voz característica, oferece à música uma componente ainda mais sonhadora, enquanto o saxofone e os sons aveludados preencheram os espaços vazios. «Kaputt» de 2011 foi o trabalho que os apresentou às massas, e talvez tenha sido por isso que arrumaram o assunto abrindo com “Chinatown”, colocando o público no sítio certo. Pouco depois, chegou “Times Square”, single de apresentação de «Poison Season» lançado em 2015. O concerto estava a ser perfeito para o público apoteótico a matar saudades de Bejar – mas nem percebo lá muito bem porquê… Os Destroyer são uma daquelas bandas excelentes em teoria. Ao vivo, tornam-se repetitivos, provocando a sensação de que estão a tocar sempre a mesma música em loop. E foi por isso que, ao fim de vinte minutos, segui para me estrear no Palco..
Não, os dois pontos não são uma gralha: eu explico. O ex-Palco ATP perdeu essa designação e chama-se agora Palco. (ao longo deste artigo assume a designação de “Palco Ponto”, por uma questão de facilidade), numa desinspirada alusão à comunicação do Município do Porto que vai acrescentando pontos em todo o lado. O ex-Palco ATP perdeu também a mais bonita iluminação que vos convido agora a recordar:
Os britânicos Beak> foram recebidos no Palco Ponto (perceberam?) com tudo a que têm direito. Difíceis de classificar, navegam entre o kraut e a electrónica, transformando-se num monstro do experimentalismo. Embora se tenham popularizado como projecto paralelo a Portishead de Geoff Barrow, é com a sonoridade pós-apocalíptica que convencem de vez quem os visita. O concerto estava a correr muito bem, quando o som decidiu falhar do lado direito do palco. Ora, este foi um dos momentos mais fofos do dia: enquanto dançava, o público alertava a banda para a falha numa espécie de flash mob dos mais alternativos. Duas tentativas de recuperação mais tarde, decidi que estava na hora de tomar lugar no palco maior e esperar Brian Wilson.
O artista espalhou a magia dos anos 60 e deu uma lição de História com o regresso aos palcos de «Pet Sounds». A idade já pesa, exigiu algum apoio no acesso ao palco, mas a jovialidade característica dos Beach Boys foi patente. Foi um concerto tão especial, único e irrepetível, que me fico por aqui: em breve, publicamos a nossa homenagem ao concerto de todos os hinos.
O Palco Pitchfork mudou de sítio este ano, e passou para a entrada do recinto. Em plena hora de jantar, Empress Of tornou-se a companhia perfeita para a refeição entre amigos, num espaço novo de food trucks com a melhor vista para a magnânime tenda. A sythnpop e os ritmos que agitam, já lhe valeram as melhores comparações a Björk. Espero que regresse em breve a Portugal, para lhe dar a devida atenção – sem estar focada nos fabulosos salgados da Padaria Ribeiro.
Britânico, experimental e imperador da electrónica: Sam Shepherd foi a revelação de 2015 com os seus Floating Points. Um palco recheado de músicos e a mais responsiva iluminação de palco deram um espectáculo completo. Não me peçam para identificar os temas que tocaram, mas confiem em mim: ganharam tudo, deveriam receber o prémio de concertão da noite. Entre dança e encantamento, a tribo que permaneceu em frente ao Palco Ponto aqueceu a noite gelada.
Mas ali ao lado, no Palco NOS, uma multidão esperava impaciente pela cabeça de cartaz. E quando PJ Harvey subiu ao palco principal, o recinto viajou até aos anos 90 e reviveu música como já não se faz. A guerreira britânica nada tem de frágil e deixou de joelhos quem tentou resistir-lhe. Foi o concerto mais magnífico da noite, e será para sempre um momento basilar na cronologia do festival. Devo confessar que não acompanho a carreira de Polly Jean, mas isso não me impede de reconhecer a magnífica presença em palco, a genialidade da composição e o merecido sucesso que cada álbum tem. Ela sim, sabe o que é girl power. Ouviu-se “The Community of Hope”, “Let England Shake”, “50ft Queenie”, “Down By The Water”, a recordar os 25 anos de carreira em nome próprio. Passou ainda pelo novo trabalho, um clássico instantâneo de uma das mais completas artistas de sempre.
Bateu a meia-noite e chegou o tempo de picar concertos, na ânsia de ver tudo. Sinto que fiz as melhores escolhas. Não, não assisti ao concerto de Beach House no seu enésimo regresso a Portugal, pelo mesmo motivo que não vi Animal Collective no Dia 1: o duo nada me diz.
Protomartyr arrasaram o Pitchfork. Só podiam ser de Detroit. Pós-punk de guitarras arranhadas, a decadência industrial vocalizada por Joe Casey, o momento perfeito para se lançarem ao crowdsurfing – não vi corajosos, contudo.
Daqui, segui para os dinossauros Tortoise, pais do multi-genre e responsáveis pela introdução do free jazz experimental. De bateria siamesa em palco, guitarras e afins, deram outro grande concerto. 2016 assistiu ao regresso aos discos, com um «The Catastrophist» em muito boa forma.
Por fim, deixei-me levar pelos ritmos digitais de Holly Herndon. Invadiu o Pitchfork em trio, apresentou a sua tese de artes digitais integradas na música com ritmos agressivos, agudos que ficam gravados na memória e ondas de som que provocam espasmos (não danças). Merecia ter mais gente a assistir – nem meia tenda estava preenchida – e também um enquadramento melhor. Um festival SEMIBREVE, por exemplo.
O dia foi marcado pela ausência de Freddie Gibbs, que permanece detido em território europeu, na sequência de uma acusação de violação, sem direito a substituição. Saiu gorada a esperança de vermos Allen Halloween por ali.
Em jeito de balanço, confesso que tive alguma pena de não ter assistido ao regresso de Dinossaur Jr ao Primavera Porto nem ao concerto dos Mudhoney. Ecos recolhidos no recinto foram unânimes: foram momentos maiores do dia. De resto, de uma forma geral, em cada conversa é este tom de contentamento que se destaca nos balanços individuais.
Resta-nos um último dia de NOS Primavera Sound, em que Cate Le Bon, Autolux, Battles, Car Seat Headrest, Drive Like Jehu, Air, Titus Andronicus, Moderat, Ty Segall e Shellac prometem ser memoráveis.