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“Isto é o passado no futuro” são os Orelha Negra a ajudar-nos com uma definição de si próprios, na dificuldade recorrente que se sente quando tentamos explicar a alguém de onde vem e para onde vai a música do colectivo português – que juntou Fred Ferreira, João Gomes, Sam the Kid, Francisco Rebelo e DJ Cruzfader há quase coisa de uma década – e que deu ontem o concerto mais sublime neste primeiro dia do Vodafone Mexefest.
Na música dos Orelha Negra a atenção ao detalhe é crucial, e garantimos que cada nova audição traz diferentes descobertas – recordamos uma entrevista em que a banda refere ter utilizado para lá de uma centena de samples neste último disco – retalhos de uma procura incessante pelas mais diversas biografias musicais, só ao alcance dos mais megalómanos, misturados eximiamente e propagados nas mais diferentes dimensões musicais. O hip hop a homenagear o funk e a soul, a esboçar paisagens de synth-pop e electrónica – o passado no futuro.
E se esta definição não vos for o suficientemente esclarecedora propomos que um dia embarquem ao vivo na viagem extra-sensorial que é um concerto da banda, como aquela a que nos entregámos ontem no Coliseu dos Recreios em Lisboa. Sabemos que esta imagem de “viagem” se encontra um tanto gasta nisto das reportagens musicais, mas acreditem em nós quando afirmamos que poucas bandas lhe farão tamanha justiça como os Orelha Negra.
À carga dramática dos crescendos de músicas como a épica “Parte de Mim” – que este ano terá pregado os ouvidos aos milhares que peregrinaram novamente à Web Submmit, no vídeo de abertura com a mão de Vhils, que nos comove com o orgulho de ser português nestes tempos tão vibrantes para a nossa cultura e tecnologia – ou como a monumental “A Sombra” junta-se também uma fortíssima componente cénica.
Os vídeos psicadélicos e futuristas (à excepção de “Throwback” feito de memórias da banda), nas primeiras músicas ajudados por uma cortina translúcida que nos fez mergulhar em 3D, levam-nos a dar o salto final para lá da estratosfera, que nem o burburinho das conversas alheias, de que padece o movimentado Mexefest, consegue perturbar. A todos os que, ao invés de aproveitarem esta viagem única, resolveram pôr a conversa em dia, a perda maior foi vossa.
Esta é a banda que dispensa microfones em palco, que nos fala por e pela música. A banda que recusa nomes para os seus discos, porque mais uma vez o que interessa é a substância muito antes da palavra, ao contrário de tantas outras bandas instrumentais que se auxiliam de complexas denominações para conseguir passar uma mensagem (só no universo do post rock encontramos um chorrilho de exemplos dos mais impossíveis e excêntricos títulos que fazem a dor de cabeça de qualquer setlist).
Completamente absorvidos por um dos melhores espectáculos que é possível neste momento ver por cá, e que esperamos poder repetir em breve, abandonamos o Coliseu com a ideia de que os Orelha Negra estão para a música como a teoria das cordas está para a física, uma sonoridade que rejeita os sons enquanto pontos isolados, mas que antes os converte em extensões musicais que se propagam pelo espaço e que interagem entre si – uma teoria unificadora para a música.