Reportagem


Slow J

Uma generosidade possível apenas para quem sabe viver em família

Super Bock Super Rock

20/07/2018


Desde que o Super Bock Super Rock assumiu o seu lado mais hip hop, de há três edições para cá, que existe um artista com residência neste dia do festival dedicado às rimas e aos beats. Slow J estreou-se no palco mais pequeno do festival em 2016, ainda um perfeito desconhecido mas já com uma The Free Food Tape cheia de diamantes brutos, no mesmo ano em que Kendrick Lamar quase derrubou os pilares da Altice Arena num dos concertos mais memoráveis de sempre. No ano passado João Batista Coelho pôs à prova a engenharia da pala do Pavilhão Portugal, pequena para albergar a família que reuniu em menos de um ano, e chegados a 2018 foi, sem surpresa, a vez do produtor, rapper e compositor subir ao palco maior do festival.

Pelo caminho editou The Art of Slowing Down, o qual já perdemos a conta às vezes que vimos ao vivo, colaborou e produziu uma mão cheia de artistas, muitos dos quais ontem também presentes em palco. Slow J pode até apregoar a lentidão mas como é que ele tem conseguido em tão pouco tempo encaixar todas estas horas de palco, nos muitos concertos de norte a sul, e acreditamos que ainda mais horas no estúdio, é coisa que nos escapa.

Sabíamos portanto que o concerto de ontem não tinha por onde falhar, a única coisa que nos aguçava a curiosidade era ver de que forma conseguiria ainda o rapaz das margens dos Sado nos surpreender, após já tantas provas dadas.

As surpresas chegaram nos convidados e na roupagem diferente que Slow J conseguiu ontem imprimir às suas próprios canções, a começar logo por “Arte” que nos soou mais lenta e menos explosiva. É sabido que o músico gosta de improvisar sobre outros artistas, o que ele fez ao Rui Veloso em “Não me Mintas”, é sem dúvida o que o Ronaldo fez ao Figo. Por isso ontem foi interessante vê-lo fazer o mesmo em algumas músicas suas. Para quem nos diz que o que mais gosta de fazer na vida é estar em estúdio deve ser afinal irresistível procurar novas sonoridades, até mesmo em músicas que já encontraram o seu destino.

O concerto começou previsível com o alinhamento do disco, com Nerve a levar-nos novamente a lugares escuros no mantra pesado de “Às Vezes”. Até chegar a palco Richie Campbell que colocou a massa adolescente em histeria para cantar “Water”, num bromance com Slow J que foi bonito de se ver. Os convidados surpresa não pararam por aqui e depois foi a vez do setubalense cumprir um novo sonho chamando a palco o artista do qual diz ter memória de ter visto no seu primeiro festival. Carlão que já tinha levado Slow J ao seu recente concerto no Rock in Rio, tomou ontem o lugar de convidado.

Faltavam ainda os convidados inseparáveis Plutónio e Papillon que vieram não para cantar The Art of Slowing Down, mas “Iminente” do disco estreia de Papillon, que o setubalense produziu e sério candidato a álbum do ano. Plutónio e Papillon estiveram presentes também cantar “Nunca Pares” de Stereossauro, outra recente colaboração de Slow J.

Com estas escolhas de setlist e convidados parece-nos que, desta vez, Slow J mais do que assumir a linha da frente, nos quis mostrar o lado de lá dos bastidores, deixando antes brilhar os artistas que tem produzido. E embora já ansiemos por novo disco seu, talvez seja mais por aqui onde o iremos encontrar no futuro. Se assim for ninguém ficará a perder, porque o seu talento é contagiante e só irá revelar o melhor de outros artistas. Uma generosidade possível apenas para quem sabe viver em família.

Galeria


(Fotos por Hugo Rodrigues)

sobre o autor

Vera Brito

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