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“You Wanted a Hit”. Poucos minutos ao vivo representam tão bem uma era, um momento da música pop. E não há aqui nenhuma reflexão com base no título da música, sobre uma geração assente no imediato, nas canções soltas, num single em vez da densidade de um disco. Nada disso. Mas já lá vamos ao que foi desde já, sem arriscar muito e sem surpresas, o concerto de Paredes de Coura 2016.
O dia começou calminho. Pouco mais de 100 pessoas ouviram às 18h Ryley Walker. Folk pausada, dormente. A marca das raízes americanas, com a particularidade de incluir uns sonzinhos hipnóticos que poderiam lembrar os GYBE!… se o pós-rock fosse estático. E claramente não o é. No palco secundário, pouco depois, outra proposta folk americana, só que vinda de outras paragens. Joana Serrat é espanhola e, vai-se lá saber porquê, comunica com o público em inglês. Tem uma voz simpática e há ali um outro diálogo entre as guitarras acústica e eléctrica interessante, mas nada de deslumbrante, nem de particularmente distintivo.
Passamos à frente a pop veraneante dos Whitney, de um antigo membro dos Unknown Mortal Orchestra, e também os minhotos Bed Legs, aparentemente a jogar em casa, dada a despedida muito calorosa que vimos quando saíram de palco. E aterramos no furacão Sleaford Mods. Uma dupla britânica endiabrada. Um deles pouco mais faz do que… carregar no play, para pôr a correr os loops graves previamente construídos (antes assim do que fingir algo que não acontece). O outro vai debitando palavras com uma urgência e raiva qb, numa espécie de spoken word subversiva e muito british. Cena UK garage / grime, com raízes nos The Streets e uma simplicidade de meios que acaba por funcionar. Pelo meio, pediram desculpa pela saída do Reino Unido da União Europeia. Desculpas pela “Little Britain” ou “This fucking England”.
De um furacão britânico para outro californiano. Do UK garage para o garage-rock. Os Thee Oh Sees voltaram a explodir com Coura, só que desta vez no palco principal. É autêntico “rock sem merdas”. Sujo, ríspido e agressivo, marcado por duas baterias imparáveis e pela distorção infinita da guitarra. Energia imensa e um manto explosivo nas margens do Coura, para um anfiteatro já muito preenchido.
Os Thee Oh Sees terminaram antes das 23:30h e os LCD Soundystem só começavam por volta das 0:20h. Ou seja, quase uma hora para montar o palco e começou a perceber-se porquê. Uma enorme maquinaria invadiu Coura, mas quem imagina os LCD como uma coisa essencialmente de laboratório, desengana-se ao vivo. Como houve quem dissesse, isto é uma espécie de orquestra electrónica. Em “You Wanted a Hit”, por exemplo, saltam entre a batida dançável, o peso da percussão, a melodia pop e um riff de guitarra que, com algum exagero, faz lembrar as explosões emotivas do pós-rock. Os LCD podem não ser pioneiros. Pode ter havido mil bandas a fazerem-no antes. Mas eles ajudaram a definir o som deste início de século, sem fronteiras estéticas. É por isso que, sendo um projecto de fundo electrónico, recordamos os teclados etéreos de “Someone Great”, as maracas omnipresentes (ainda que em formato digital), os devaneios do extraordinário baterista, a evolução rítmica de “Yeah” ou a spoken word diabólica de “Losing My Edge”. Porque é tudo muito orgânico, independentemente da maquinaria electrónica que ajuda a produzir e a aperfeiçoar o que ouvimos. Fecharam com um trio perfeito: a melancolia rock de “New York I Love You”, a transição abrupta e perfeita de “Dance Yrself Clean” e, claro, o hino à amizade que é “All My Friends”. Com o teclado martelado na cabeça, não houve encore e nada nada faria sentido depois disso. Quem questionou se tinha lógica o regresso dos LCD, é porque não os viu ao vivo. Em fundo, ouve-se Nothing Compares 2 U, de Sinead O’Connor, e vamos à nossa vida. Com a certeza de que estivemos num momento inesquecível (e irrepetível?) e num dos grandes concertos do ano em Portugal,
E se nada mais faria sentido depois de “All My Friends”, também é difícil que algo mais faça sentido depois dos LCD Soundsystem. É a marca dos grandes concertos: tudo o resto perde importância. E, no caso, a fava caiu para o lado dos canadianos Suuns. Com a influência dos ritmos africanos urbanos pesadões e com a chuva a fazer a habitual aparição, o after hours terminaria com o DJ set de Branko e Rastronaut. E se há coisa que se pode e deve elogiar é o ecletismo das propostas de final de noite. Longe vão os tempos de escolhas musicais “para pastilhados”, que não faziam jus à qualidade e ao estilo do festival.